Back to basics
Ser criança, olhar para tudo
com olhar de entusiasmo. E se todos fossemos criança, como seria o mundo?
Todos os maus já foram
crianças. Já andaram de fraldas, já gatinharam, já deram os primeiros passos. Todos na rua com quem nos
cruzamos já foram crianças: o
taxista que nos leva até a uma reunião algures; a pessoa que nos atende ao
balcão dum café antes de entrarmos na dita reunião; as pessoas na reunião.
Qual seria a primeira coisa
que faríamos se fossemos crianças? Festejaríamos o facto de descobrirmos alguma
coisa. Que o táxi Mercedes tem um braço para apoiar e que desce, por exemplo.
Que o taxista tem um bigode "muita giro". Que a reunião onde temos as pessoas
sentadas tem umas cadeira muito antigas e muito chiques e que estão todos muito
bem sentados e de gravata. Quando víssemos alguém a
gritar com outra pessoa qualquer era, porque lhe tinham tirado alguma coisa dela
sem lhe perguntarem primeiro. Ou porque em casa alguém a tinha "chateado", e ela
estaria por isso "chateada". Dar-nos-íamos com as Rutes, os
Rubens e todos os outros, porque estaríamos no mesmo sítio, e é giro andarmos
todos lá. Pretos, chineses, indianos ou alentejanos seriam para nós apenas as
diferenças de cor e de sotaque, uns com o cabelo assado outros, com o cabelo
mais assim, uns que acharíamos mais bonitos que outros, mas realmente quem mais
admiraríamos seria aquele em que se veem as veias nos braços e é "muita forte". Emprestaríamos as nossas
coisas aos outros porque a nossa mãe sempre nos disse que é bonito partilhar. Cumprimentaríamos sempre os
outros e, se alguém precisasse de alguma coisa, nem que fosse de uma
brincadeira para não estar tão sério, não haveria problema porque há sempre
tempo para tudo, até para fazer uma grande palhaçada.
A melhor coisa seria andar no
meio do trânsito de bicicleta, ou mesmo aqueles que conseguem descer a rua de
skate. Andar na rua até tarde, jogar futebol com os amigos eram o melhor das
tardes de Verão.
Custa-nos acreditar, mas mesmo
Hitler foi uma criança. Teve pais, se calhar também teve irmãos. Teríamos medo
de estar com ele quando ele já fosse velho? Se nos lembrássemos que ele foi
criança, provavelmente não.
O nosso sentido de justiça
seria sempre apurado. Para nós qualquer coisa que nos fizessem sempre
perceberíamos como uma diatribe, uma má-criação: o seu pai depois em casa
ir-se-ia zangar com ele, pô-lo de castigo, se calhar.
Teríamos sempre entusiasmo por
acordar no dia seguinte. Cada dia seria uma aventura. Estar com tantos amigos,
descobrir tantas coisas. Talvez fazer uma corrida na praia a ver quem ganharia.
Todos a correr, a ver que ganha. Acharíamos ridículo aquele que
se achasse melhor do que os outros, que dissesse que era bom demais para correr
connosco. Aí logo intimamente pensássemos que tinha "miaúfa" de correr e de
perder.
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