Servidão Humana

Philip, um jovem com pé boto é a personagem que Somerset Maugham retrata no seu extenso livro "Servidão Humana". Do pai médico, que morre ainda ele não era nascido e da mãe que morre pouco tempo na sequência do parto, a vida de Philip parece uma continuação de partos mal sucedidos e de vidas que fenecem. 
 
Numa escrita que é um trabalho meticuloso, Maugham apresenta-nos o ser humano mergulhado nas múltiplas contingências da vida: o tio pastor e a tia reprimida, mas com amor para dar; a escola onde os outros o escarneces por causa do seu pé defeituoso; as amizade e os sentimentos complexos como o da admiração/inveja. Ou a religiosidade imposta. 
 
Dá-se então o facto de - quase por desespero, rasgar-se uma janela de liberdade: a ida para a Alemanha, para Heidelberg e o encontro com a diferença. E segue-se a tentativa de se encaixar de novo, abraçando uma profissão convencional, a de contabilista. E, depois, um novo rasgar com a partida para Paris, para se tornar pintor. De decepções e de coragem, é disso que este livro fala. De uma nova vida que nasce entretanto, a de médico, e do amor ao qual se entrega...and so on, and so on..
 
Deste livro podemos dizer que nos abre para a perspectiva da vida como um processo em que, de cada coisa que se vive, pouco do esperado se concretiza, mas em que a pessoa se descobre por esse viver, feito de limitações, de estados de alma, de ligação com os outros. Chegando agora mais ao menos a meio do livro, uma vida que era quase estéril de amor, começa a ver que a principal ética é uma ética concreta. Penso que é aí que eu estou e será essa a história que se segue. Da mulher por quem ele dava tudo, mas que o rejeita, Philip sente-se acolhido num novo amor, ele que nunca fora amado... e parece-me que começo a ler agora a melhor parte!

Comentários

Anonymous disse…
Da experiência demencial que é a vida, por vezes afiada como um cutelo sujo de talhante, ou suave como uma seda que cobre um corpo quente tocado pela primeira vez, o homem tece, nesse tear imenso, que desce do azul profundo, como se não houvesse "em cima" e "em baixo" - e não há, a essência do seu próprio espírito. Pergunto-me todos os dias, sem excepção, que teia é esta que vou tecendo incansavelmente, numa servidão infinita?
Esperamos o final dessa leitura e a visão bela da malha que a servidão dum homem desamado,Phillip, pode tecer.

JMR

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