3, Beleza e contemplação. Na fragilidade do equilíbrio...
Se me pedisses para escolher um quadro, uma escultura, um qualquer objecto de arte, o que traria comigo?
Gosto muito de Monet e das suas paisagens. A pintura impressionista é bela e dá alegria à vida.
Há um pintor holandês que me impressiona pelos ambientes interiores que cria, seu nome é Vermeer. Ele pinta o simples, pinta as pessoas no seu ambiente natural. Penso que é George Steiner que dizia que ele é tão bom que consegue pintar o silêncio.
Dos pintores que mais me comovem certamente que Cézanne é um deles. Eu acho que há nas suas naturezas mortas algo de espiritual, uma luz que resplandece. Uma simples cesta de frutos é uma simples cesta de frutos, mas há nela uma tal irradiação que dá vida. É uma natureza morta... que vive, que tem luz própria.
Outro Mestre que tem o condão de nos fazer despertar para a alegria de vida é Matisse. Faço uma citação (Matisse, Taschen):
"A Clara MacChesnay, que se admirava, em 1913, que uma obra tão «anormal» tivesse como autor um homem tão «vulgar e são», Matisse respondeu: «Oh! diga, de facto, aos americanos que eu sou um homem normal; que sou um pai e um marido dedicado, que tenho três bonitos filhos, que vou ao teatro, que pratico a equitação, que tenho uma casa confortável, um belo jardim que adoro, que tenho flores, etc., exactamente como toda a gente» (...)
Não é impunemente que Matisse sonha com uma «arte de equilíbrio, de pureza, de tranquilidade, sem motivo inquietante ou preocupante, que seja, para qualquer trabalhador cerebral, para o homem de negócios assim como para o artista das letras, por exemplo, um lenitivo, um calmante cerebral, alguma coisa de parecido com uma poltrona em que ele descanse das suas fadigas físicas"(...)
Matisse, insurge-se, por exemplo, contra a afirmação de René Huyghe que lhe atribui «uma impassibilidade estranha e requintada». «Como se pode fazer arte sem paixão?», responde ele. «Sem paixão, não há arte. O artista domina-se, mais ou menos segundo os casos, mas é a paixão que motiva a sua obra. A angústia? Ela não é hoje pior que foi para os românticos. É preciso dominar tudo isto. É preciso ser-se calmo; e a arte não deve inquietar nem perturbar - deve ser equilibrada, pura, repousante".
Escolher um objecto de arte...
Há neste quadro de Seurat algo que me interpela. Os tons de azul e verde, os pés refrescando-se na água do rio. O rapaz, concentrado nos seus pensamentos - diria até absorto nos seus pensamentos, está como que no lugar de charneira num mundo que roda a grande velocidade. Os barcos à vela dão a nota de um mundo bucólico, mas ao fundo as chaminés das fábricas, expelindo fumo, apontam a inexorabilidade do progresso. E no meio de tudo, o rapaz, costas arqueadas, olhar que não se fixa em nada, nessa paragem momentânea, está a pensar. Ele sabe que o mundo avança.
Na água, jovens brincam, felizes.
Na relva adultos descansam.
Aquele jovem é uma verdadeira charneira. Já não é criança, mas ainda não é adulto. Está na relva com os adultos, mas os pés mergulham na agua onde estão as crianças; está entre o moderno e o novo. A sua cabeça toca o espaço das fabricas, mas o seus olhos estão virados para o repouso das águas refrescantes.
Em que pensa ele?!
Ele é a personagem principal, mas sem os outros à sua volta não seria possível perceber o quadro.
Tenho namorado este quadro para uma parede de minha casa. Gosto de olhar para a imagem do quadro, dá-me alguma paz: há nesta paragem momentânea esse balanço, equilibrado, mas muitíssimo, muitíssimo frágil dos momentos em que nos entregamos aos nossos pensamentos e que norteiam a nossa acção. Tudo neste quadro nos fala de resiliência. Há uma linha muito ténue nele que nos fala de se tornar adulto ou voltar a ser criança, entre a maturidade e a infantilidade, entre baixar os braços e chapinhar na água ou se empregar na luta. Neste intervalo que é o quadro, há verdade. Ainda só há pensamento. A decisão há-de vir! O quadro é todo ele suspensão, e há uma tensão muito ténue nele cuja resposta será dada pelo que o jovem decidir. Tudo está ainda em aberto, mas por enquanto o jovem descansa com os pés na frescura da água.
Tenho namorado este quadro para uma parede de minha casa. Gosto de olhar para a imagem do quadro, dá-me alguma paz: há nesta paragem momentânea esse balanço, equilibrado, mas muitíssimo, muitíssimo frágil dos momentos em que nos entregamos aos nossos pensamentos e que norteiam a nossa acção. Tudo neste quadro nos fala de resiliência. Há uma linha muito ténue nele que nos fala de se tornar adulto ou voltar a ser criança, entre a maturidade e a infantilidade, entre baixar os braços e chapinhar na água ou se empregar na luta. Neste intervalo que é o quadro, há verdade. Ainda só há pensamento. A decisão há-de vir! O quadro é todo ele suspensão, e há uma tensão muito ténue nele cuja resposta será dada pelo que o jovem decidir. Tudo está ainda em aberto, mas por enquanto o jovem descansa com os pés na frescura da água.
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