Na véspera de Natal
Estou sentado na quartinho de minha casa, transformado em escritório. É véspera de Natal, está um dia limpo, já saí à rua para beber um café.
No topo dum hotel, à vista da minha janela, uma bandeira portuguesa esvoaça ao sabor do vento.
Vou daqui a pouco sair de novo à rua para tratar dum assunto de trabalho. Depois voltarei a casa para pegar em tudo e ir para Sintra, onde estarei até ao final do mês.
Os últimos dias têm sido cheios de encontros, o mais das vezes à mesa, o que é sempre bom pois proporciona boas conversas. Estive com o Nuno, com o Zé Frederico, com a Filipa, com os meus tios Frederico, Lívia, Tomás e Maria José, com o Jan, com a Andrea e outros.
Ao longo dos últimos tempos tenho estado com dezenas de pessoas, em estilo "cognac" e em estilo "trabalho". O em estilo "trabalho" custa sempre mais, mas por exemplo tenho conseguido em certos casos partilhar com o Nuno bons momentos de relaxe depois, comendo um bom bife com batatas fritas... acompanhado de bom tinto.
Somos as nossas relações. Elas são muito importantes, creio convictamente nisso.
O ano correu bem do ponto de vista de trabalho. Tenho os assuntos mais ou menos organizados, é questão de continuar na mesma senda.
Agora, uma semana de descanso também me fará bem.
Fiz a mala, tenho as coisas à porta de casa. Vou estar com os meus pais e meus irmãos. Hoje irei ao final do dia à Missa do Galo.
Levo uma perna de presunto para dar a um dos meus irmãos, o Francisco (todos os anos sorteamos entre nós a quem damos presente de Natal). Comprei-a ao meu amigo José Frederico Fonseca. Gastei uma nota, mas fi-lo com todo o gosto. Na semana passada combinámos encontrar-nos para me trazer a encomenda e levei-o para beber algo a um restaurante muito giro, o "Honest Greens", que abriu recentemente aqui por perto. Comentou-me que o seu pai me vira em S. Domingos no dia 1 de Dezembro, ele estava com a Sociedade Histórica da Independência de Portugal numa missa por ocasião da comemoração da Restauração. Estivemos a falar (o Zé e eu) e ficou a ideia de poder entrar para esta associação. Fazer parte duma instituição que cultiva a nossa história e a nossa identidade é algo de que gosto, quem sabe terei também aí lugar para apresentar o meu livro, o "Quo Vadis, Portugal?" (algo que não consegui na SEDES).
Esta semana também, tive a segunda reunião na Alliance Française. Sou agora do Conselho Fiscal e todos os meses temos lá uma reunião. A cultura francesa interessa-me, quero continuar a praticar o francês, aliás tenho vários clientes franceses (o facto de ser português não me fecha num nacionalismo estúpido, deve antes permitir-me abrir a encetar um diálogo com outras "circunstâncias". Por exemplo, esta semana gostei muito de ir jantar com o Jan Lerch, meu amigo alemão).
Por falar em "circunstância", trata-se duma palavra que me tem marcado nos últimos meses. Em Outubro, em Óbidos, li trechos da biografia de Ortega y Gasset. Acho mesmo que a visão que temos do mundo e das coisas depende muito da janela porque olhamos a realidade, "eu sou eu e a minha circunstância". Esta janela donde avisto o hotel com a bandeira que esvoaça é um plano de vista, mas na minha vida olho naturalmente sempre tudo do meu plano de vista. Ora isso, necessariamente, marca uma maneira própria de olhar, que cada um empresta à realidade.
No outro dia, enquanto jantava com o Jan falávamos de alguns autores como Milan Kundera e Michel Houllebecq. Grandes escritores têm o dom de perspectivar a vida a partir das circunstâncias únicas de cada personagem, são mestres mesmo na arte de falar da vida a partir da/s janela/s de cada uma das suas personagens. É isso que dá o colorido à realidade e que nos faz reflectir e, talvez "planar", através de cada olhar.
Ontem recebi um livro, uma surpresa da Juliana, minha coach: "Start with Why", de Simon Sinek, um livro sobre a arte da liderança. Os líderes são aqueles que percebem o enorme colorido da vida e que têm a capacidade de ir ao encontro do outro. Um dos capítulos do seu livro é "Communication is not about speaking, it's about Listening". É isso mesmo, pois o mais caro a cada um é o que se passa no seu mais íntimo, no que lhe vai na alma - e é isso que é mais importante "ouvir" no outro; quando conseguimos colocar a pergunta essencial que é a pergunta do sentido. É precisamente o que o autor se refere ao convidar-nos a "start with why".
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