Ser um bom professor

Que qualidades precisa um professor de crianças e jovens ter? Eu acho que a principal qualidade deve ser o entusiasmo. Um professor deve ser uma pessoa que crê com uma grande intensidade nos seus púpilos. Que vê neles coisas muito boas, que aposta neles, que espera deles muito. Tem que ser uma pessoa de bem com a vida, que vê prazer nas coisas.
O Diário do Sebastião da Gama é um primor nestes aspectos: um professor que crê enormemente nos seus alunos, que os acompanha diariamente, que nota neles progressos. Há lá páginas deliciosas: ele tem um pequeno grupo de alunos e faz semanas temáticas. Pede aos alunos para fazer composições. Diz que a Gramática é algo de que os alunos não gostam, é como dissecar um cadáver. Por isso não insiste logo ao princípio nisso. Quando há pássaros a passar, prefere talvez parar a aula e falar sobre isso. Um professor deve estar atento. E ele está e muito. Fala com os alunos. Fala também com o seu orientador. Medita o que faz. Exprime também os seus sentimentos: hoje dei uma aula óptima. Sente-se preenchido. Uma coisa que achei muito interessante nele é que ele domina extraordinariamente a matéria que dá. Tem uma mestria da língua portuguesa.
Para ser professor do que quer que seja, a primeira condição é ter paixão por ensinar. E eu lembro-me de ter entusiasmo por ensinar. Gostar de preparar bem as aulas, falar-lhes de histórias.
Lembro-me de no Liceu Rainha D. Amélia ter tido um grupo de alunos muito bom. Eram pessoas com um grau de maturidade já bastante bom. Tinham conversas interessantes, eram bons. Certo dia pu-los a falar de coisas mais sérias e eles deram um registo muito bonito da sua vida. Conseguiam falar dos outros com respeito e ver neles coisas boas.
Para se ser um bom professor é muito importante esse entusiasmo de que falava, o entusiasmo ou mesmo a paixão por ensinar. Por conviver com pessoas mais novas. Eles são o principal destinatário do nosso trabalho, do nosso esforço.
Também é necessário sermos competentes. Sermos pessoas bem preparadas do ponto de vista técnico – saber do que estamos a falar. Um professor de matemática tem que saber do que fala. Tem que trabalhar muito, tem que fazer exercícios e corrigi-los, tem que acompanhar os seus alunos e saber esclarecer dúvidas e moldar o ritmo da sua aula em conformidade com a velocidade de aprendizagem dos seus alunos.
Já que falo em matemática, uma disciplina essencial do currículo de qualquer pessoa, uma tia minha que dá aulas num colégio em Lisbo procura ter uma abordagem o menos teórica possível. Deve ser interessante ser professor de matemática e tentar passar aos seus alunos a ideia de que a matemática é uma ferramenta para a vida - como faz esta minha tia. Que ela é essencial quando temos que fazer um bolo por exemplo, que ela é fundamental quando temos que calcular percentagens, que ela é muito importante para fazermos contas de contabilidade diária. É claro que a matemática, às tantas, se torna uma disciplina abstracta, com pouca relação com a vida. E isso começa a ser evidente a partir do 10.º ano, se calhar mais cedo ainda. Mas um professor sempre pode, até lá, falar de matemática como se de exercícios do dia-a-dia se tratasse: como fiz na primária em que os exercícios eram sempre contextualizados em situações de mercearia, em jogos de rapaziada, em situações da vida. A matemática é algo que exige uma grande preparação técnica e melhor será aquele professor que já tiver uma grande experiência. Porque muitas vezes a resolução de problemas e dificuldades de um aluno passa por construir bases sólidas que nunca foram construídas.
Já falei de duas coisas importantes: entusiasmo e saber técnico, competência.
Um professor deve ainda ter as seguintes qualidades: disciplina e organização, paciência, bom senso e equilíbrio.
Ser disciplinado e organizado é muito importante. Há muitas turmas em que uma pessoa se tem que desdobrar. Tem que preparar as aulas, lembrar-se dos contextos diferentes das aulas, há também reuniões a ter, há que ir avaliando os alunos, registar impressões, ter uma certa coerência pedagógica com os alunos, etc. Por isso o professor deve ser uma pessoa bastante disciplinada. Organizado também – deve haver hábitos, como por ex. o de escrever no livro de ponto.
A paciência porquê? Há coisas aborrecidas na vida de professor também. Reuniões mal conduzidas e onde se perde tempo, não se decide nada, etc. Turmas difíceis e onde é também difícil mudar alguma coisa. Há um desgaste grande na actividade de professor.
Bom senso grande – o professor tem que ter noção das suas limitações, dos impossíveis, tem que lidar com a arte do possível. A sua acção é levada ao cabo dentro de instituições. Há que saber ler personalidades e maneiras de actuar diferentes, não temos uma varinha de condão para mudar o mundo. Não vamos resolver os problemas todos.

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