De onde viemos?
Ontem, pela noite, insónia adentro, liguei a televisão e sintonizei-me com um programa sobre o Caminho de Santiago. Um espanhol, jovem e divertido, deambulava pelas ruas de Paris, passeava pelo Sena, sentava-se naqueles bancos de jardim nas pracetas daquela cidade cheia de luz e de traços beijes. Novidade para mim, descobri em Paris a torre de Santiago, ponto de partida de peregrinos desde os mais remotos tempos desta rota. Amanhã parto para a Arrábida, terra mediterrânica do Portugal atlântico. Reminiscências dum mundo antigo, feito à volta do Mare Nostrum, entre cidades gregas, italianas, com pontos de contacto no Norte de África, ilhas como Sicília e Córsega e extensões a Ocidente como Cartagena e mais longinquamente Lisboa. Teolinda Gersão escreveu agora um novo livro sobre esta nossa cidade, trazendo de volta a memória da sua antiguidade. No Mediterrâneo, berço da civilização, o Homem interrogou-se e pensou. Aqui temos Sócrates que se olha ao espelho (e ele que era feio!), aqui temos Platão e Aristóteles. Mais tarde é o Império Romano, que tantos hábitos nos deixou, verdadeiro embrião da moral familiar e do direito. A riqueza do Mediterrâneo entende-se na minha perspectiva e mais do que nunca, no tempo da Idade Média. Entende-se pelo comércio, pelas peregrinações, pelas catedrais. A própria Idade Média entende-se em parte pelo espírito franciscano, fruto duma primeira Renascença (séc. XII?). Entende-se no espírito de Cruzadas, que une toda a Europa Cristã.
O que surpreende no Mediterrâneo é um certo despojamento. Tem que ver com uma natureza simples, mas rica de cheiros e sabores. Tem que ver com um contacto com a água, com a pesca. Descobre-se também na nossa costa atlântica, pelos hábitos da população. Sesimbra, Arrábida mas porque não Nazaré e outras?! Herdeiros de cristãos, judeus e mouros. Daqui viemos. Duma herança rica em histórias, em hábitos, de ligação com a natureza e também de festa!
É claro que isto é uma imagem romântica... mas é uma imagem e as imagens criam vida, criam história... em suma, criam.
Indigna talvez que nos atirarem à cara os povos do Norte da Europa a acusação de não trabalharmos o suficiente. Sei que não trabalhamos tanto como os alemães; esses só sabem é trabalhar. Mas, e aqui recorro-me às conversas que comecei a manter com a minha amiga Mariana que quase sempre viveu na Holanda e com outra amiga, a Julie que é alemã, sobre a diferença que se encontra entre estes povos mediterrânicos e Portugal (que em bom rigor não é mediterrânico) e uma certa falta de empatia que se vê muitas vezes no Norte da Europa.
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