artigo de João Carlos Espada "Esperança na Educação" e comentário

«Esperança na Educação


Público 2011-09-05 João Carlos Espada


É muito estimulante ouvir um ministro definir como marcas uma maior autonomia das escolas e uma maior exigência


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A entrevista concedida pelo ministro da Educação ao jornal Expresso, no passado sábado, deu um sinal de esperança. É um sinal importante, sobretudo numa semana em que basicamente se anunciaram mais aumentos de impostos - acompanhados de mais promessas de cortes na colossal despesa do Estado. Mas, para que a esperança se não esfume, é importante que o impulso reformador de Nuno Crato enfrente no sector da educação um dos problemas-chave do país: a falta de concorrência efectiva.
É muito estimulante ouvir dizer a um ministro da Educação que as marcas que gostaria de deixar no seu mandato são sobretudo as de maior autonomia das escolas e de maior exigência.
É gratificante ouvir explicar que a falta de exigência no ensino penaliza sobretudo os alunos de famílias mais desfavorecidas: pensou-se "que a exigência vai prejudicar os pobres, quando no fundo é exactamente o contrário - vai dar mais oportunidades aos pobres".
É ainda muito gratificante ler a crítica do ministro da Educação aos sistemas centralizados e a defesa das soluções locais, tão próximas quanto possível dos problemas que é necessários resolver. É gratificante saber que o ministro considera normal que, por exemplo, as aulas possam ter duração variável em escolas diferentes. E que o papel do Ministério da Educação não é dirigir em detalhe a vida e os programas das escolas, mas sobretudo o de "estabelecer apenas uns limites amplos dentro dos quais as escolas se organizem."
Mas é igualmente importante clarificar o que se entende por "descentralização do sistema escolar." O sistema inglês é descentralizado, cada escola é dirigida por conselhos locais, envolvendo as autarquias, os pais e os professores. No entanto, Tony Blair considerou que mesmo esse sistema descentralizado sofria de falta de concorrência. E uma das principais reformas prometidas pelo actual governo de David Cameron consiste em acentuar a concorrência iniciada por Blair.
De que concorrência se trata? Blair e Cameron citam o exemplo da Suécia - um tema lamentavelmente ausente na entrevista do nosso ministro da Educação. O que os suecos fizeram, no início da década de 1990, foi quebrar o oligopólio fechado do sistema de ensino estatal.
Basicamente, consideraram que a escola pública não abrange apenas a escola do Estado. Abrange todas as escolas, estatais, privadas ou cooperativas, que respeitem um conjunto de regras gerais (os tais "limites amplos dentro dos quais as escolas se organizem", para citar Nuno Crato). Os alunos podem então escolher livremente a escola - estatal, privada ou cooperativa, que subscreva essas regras gerais. E o Estado paga as propinas desse aluno, até um limite que é igual para todas. As escolas que aceitam este sistema de financiamento não podem cobrar mais do que esse limite.
Os resultados desta reforma têm sido espectaculares. A qualidade do ensino, medida pelos resultados alcançados em exames nacionais, melhorou exponencialmente. Por isso, os ingleses foram estudar o "milagre sueco".
A chave do milagre sueco chama-se concorrência. As escolas do Estado deixaram de receber alunos e financiamento pré-definidos pela área de residência (ou pela ausência de recursos dos alunos para pagarem escolas privadas). Passaram a ter de concorrer com todas as outras escolas para atrair alunos... e financiamento. Simultaneamente, surgiram novas escolas privadas e cooperativas, religiosas e não religiosas, muitas promovidas por grupos de professores, que aumentaram ainda mais a concorrência.
Isto deu um significado à expressão "autonomia das escolas". Essa autonomia foi colocada ao serviço dos consumidores, isto é dos alunos e das famílias, e não do capricho de conselhos locais de autogestão (como é o caso inglês). Cada escola ficou assim, não apenas "autónoma", mas "autónoma" para procurar as melhores soluções susceptíveis de produzir os melhores resultados e, dessa forma, atrair mais alunos... e mais financiamento.
Talvez também nós pudéssemos ganhar alguma coisa estudando o "milagre sueco"».

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Comentário:

1. Concordo absolutamente com a questão da autonomia. Não podia estar mais de acordo. Sobretudo acabar com a enorme BUROCRACIA que emanava do ME e das DREL que asfixiam as escolas. DAR ESPAÇO ÀS ESCOLAS PARA RESPIRAR E FAZER COM QUE AS PESSOAS FAÇAM O SEU TRABALHO QUE É ENSINAR.
2. É importante uma concorrência entre escolas e de há muito que se pretende fazer uma verdadeira liberdade de ensino em que os pais possam escolher a escola dos seus filhos, independentemente de ser pública, privada ou cooperativa. VAMOS PÔR AS ESCOLAS A COMPETIR PELOS ALUNOS, É UMA BOA IDÉIA.
3. No que diz respeito ao chamado "milagre sueco", apenas uma àparte, sem conhecer o referido "modelo sueco", gostava de perceber porque é que ele funcionou lá. E se funcionou lá significa que funcionará cá? Não forçosamente. NÃO HÁ RECEITAS PRONTAS A USAR, APENAS LIÇÕES A RETIRAR. Daí que concorde com João Carlos Espada em que poderemos talvez aprender com esse modelo, apenas isso... 
4. Eu tenho acompanhado mais ou menos de perto a Educação em Portugal e posso dizer por exemplo que desde há anos que considero excelente o papel da Inspecção Geral de Educação. Vão lá ao site deles e vejam! Vejam os relatórios de avaliação pragmáticos e operacionais escola por escola. Aproveite-se o que de bom existe, e há muito de bom! Por isso, cuidado com as críticas ao passado e com a tentativa de "reiventar" a Educação que me parece de alguma maneira estar a querer-se colar a este ministro. O QUE EXISTE DE BOM NO PASSADO?
5. Independentemente da possibilidade da grande melhoria do sistema com a introdução da concorrência a que João Carlos Espada faz referência, penso que um dos principais problemas se prende com a falta de lideranças a nível local e com falta de foco dos agentes no terreno. Em todas as escolas devia-se apostar fortemente em FORMAÇÃO PARA A LIDERANÇA, EM FORMAÇÃO PARA CRIAR UMA CULTURA DE ESCOLA.
7. O Ministro Nuno Crato tem que poder gozar de legitimidade política e margem de manobra política (lembramo-nos como a foi perdendo Maria de Lourdes Rodrigues?). Uma questão aqui coloco: os sindicatos, e em especial a FENPROF defende mesmo o interesse da classe dos Professores? Ou têm uma agenda política? A seguir de perto... como deve pautar-se a relação do Ministro com os sindicatos? Confesso que não sei!
8. O sector da Educação é curioso pois é dos tais em que mais do que as intenções de cada ministro, que podem ser boas ou más, marcam muitos contingentes: o orçamento - que agora em tempos de crise foi reduzido; os sindicatos; a luta com os outros Partidos Políticos; a adesão dos profissionais do Sector; a Opinião Pública. É preciso alguém muito resistente à sua frente (lembramo-nos da Maria de Lourdes Rodrigues e do que ela teve que enfrentar?) e com uma grande capacidade política. A ver vamos o que nos reserva também este Ministro numa área tão importante e decisiva. 

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