Batalhas
Esta semana, enquanto parece que fomos derrotados novamente em Alcácer Quibir, estive a rever a estratégia de Aljubarrota e é um daqueles episódios em que realmente contou a estratégia montada (recomendo vivamente ir-se ao Centro Interpretativo da Batalha de Aljubarrota, muito bem feito e pedagógico).
As tropas portuguesas, naquele dia de 14 de Agosto eram várias vezes inferiores em dimensão às tropas castelhanas. D. Nuno Álvares Pereira tinha batido o pé no conselho: devíamos dar pleito aos espanhóis; o Rei não concordou com ele e o Condestável sai sozinho, pelo seu pé. A alternativa a uma refrega agora seria um avanço de D. Juan sobre Lisboa, que nós não iríamos conseguir aguentar: era essa a tese de D. Nuno. Assim, seria melhor uma antecipação. Um ou dois dias depois, D. João I revê a sua posição e junta-se a ele.
D. Nuno Álvares Pereira muda pelo menos uma vez de palco de operações, até encontrar aquele que melhor servia os seus intentos: apanhar os espanhóis sem que eles tivessem espaço para manobra, ao fim ao cabo, encurralá-los num desfiladeiro. A técnica de organização do seu exército tê-la-á aprendido na Guerra dos 100 anos e compreendia a construção de fossos que mais dificultassem a progressão do inimigo. Archeiros disparariam revoadas de setas, lançando uma terrível chuva mortal sobre os castelhanos. Nas nossas tropas contávamos com mais de um milhar de soldados britânicos.
Diz-se que terá havido precipitação por parte dos espanhóis, sobretudo de cavaleiros jovens que achavam que a vitória seria garantida e por isso, sem que tivesse sido dada ordem de ataque, saem em posição de combate.
E voltei a um pequeno conto de Eça de Queiroz, intitulado "a Catástrofe" em que sucede exactamente o contrário: o esmorecimento, a lassidão, o entorpecimento. O inimigo conquista Lisboa, a sentinela garbosa na guarita, está bem plantado de fronte de casa do narrador, que se queixa:
"(... a não ser que feche as janelas, que me enterre numa treva constante, que viva à luz do gás quando o sol de Julho faísca lá fora, não posso deixar de ver diante de mim, como um memento odioso, à porta do Arsenal, a sentinela estrangeira pisando a terra Pátria
(...) aquela sentinela, eterna, que me parece sempre a mesma, tem um ar de estabilidade, de perpetuidade que me faz o coração negro. Cada passada que ela dá com a sua dura sola, cai-me com um eco lúgubre na alma, e no seu monótono passeio, de guarita em guarita a guarita, dá-me a sensação de que nunca deixará de haver, sobre a terra portuguesa, uma sentinela estrangeira (...)
De modo que, agora, já conheço quase todas as sentinelas do Arsenal (...) É o rapagão robusto, sólido, bem plantado sobre as pernas, de cara decidida e olhos reluzentes; penso sempre: FOI ESTE QUE NOS VENCEU! Não sei porquê, lembrando-me do nosso próprio soldado, bisonho, sujo, encolhido, enfezado do mau ar dos quartéis e da insalubridade dos ranchos (...)
E no fim do conto:
(...) Por mim, todos os dias levo os meus filhos à janela, tomo-os sobre os joelhos e mostro-lhes a SENTINELA! Mostro-lha, passeando devagar, de guarita a guarita, na sombra que faz o edifício ao cálido sol de Julho e embebo-os do horror, do ódio daquele soldado estrangeiro... Conto-lhes então os detalhes da invasão, as desgraças, os episódios temerosos, os capítulos sanguinolentos da sinistra história... Depois aponto-lhes o futuro - e faço-lhes desejar ardentemente o dia em que, desta casa que habitam, desta janela, vejam, sobre a terra de Portugal, passear outra vez uma sentinela portuguesa! E, para isso mostro-lhes o caminho seguro - aquele que nós devíamos ter seguido: trabalhar, crer, e, sendo pequenos pelo território, sermos grandes pela actividade, pela liberdade, pela ciência, pela coragem, pela força da alma..."
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