Rezando a vida com Churchill

Pode parecer um contrancenso uma proposta de se rezar com Churchill, um homem de quem se diz que não há provas convincentes de que tivesse convicções religiosas. Na realidade, na década de 1890, Churchill disse que a humanidade evoluiria a ponto de "o cristianismo ser posto de lado como uma muleta que já não é necessária e o homem ficará erecto sobre as pernas firmes da razão". Acrescentou ainda "espero a aniquilação na morte. Sou um materialista - até às pontas dos meus dedos". Embora - como se vê, não tivesse convicções religiosas, Churchill era um homem que tinha uma franca noção da separação entre o bem e o mal, a ponto de dedicar todas as suas forças à tentativa de acabar com uma das maiores tragédias do séc. XX, a possibilidade de domínio do nazismo na Europa. 

Onde ia buscar forças? Com alguma ironia, poderíamos dizer que certamente uma das suas fontes era a "pipa", o whisky... mas certamente que outra delas era a arte e os momentos a que ela se dedicava. Aí parava e se sintonizava consigo próprio.

Durante muitos anos, tive por hábito todos os meses parar um pouco, numa espécie de revisão. É algo que é talvez contra a lógica das coisas, mas faz-nos bem, pois como acontecia com as paragens de Churchill, ajuda-nos a melhor nos sintonizar!

Saber parar…

Quando Winston Churchill se tornou primeiro-ministro em 1940, terá considerado que o seu carro de 23,5 cavalos de potência - parte de um conjunto de carros colocados à disposição do Gabinete de Guerra, não era suficientemente rápido. E assim foi substituído por um modelo mais rápido, de 28 cavalos de potência.

Churchill gostava de guiar e como consta que gostava de emoções fortes, vou aqui presumir que não seria especialmente afoito a poupar o pedal..

Ter o carro sempre em andamento, forçar o motor até aos seus limites de resistência, não vigiando se lhe falta água ou óleo, é um erro que sabemos que não nos dará garantia de não ficarmos um dia parados a caminho de algo… Revisões regulares, em que possamos fazer um check-up à saúde do carro, são sinal de prudência. E importa que seja uma revisão geral. 

A nossa vida é obviamente muito mais importante que a saúde do nosso carro. Por isso, mais importante é que, de tempos a tempos, adquiramos o hábito de olhar para nós, para o que tem sido a nossa vida e a revamos com toda a honestidade.

É algo que por vezes custa. Pode demorar tempo e não nos devemos satisfazer com um simples flasback. Diríamos:A comer de pé, tu comes mal. Senta-te! Mastiga com calma!” 

Deves escolher um local onde te sintas bem, onde sabes que sobretudo terás a paz para estar contigo próprio. Em que não terás distracções. Às vezes, andar é uma boa forma para realizar este exercício.

As paragens para Chuurchill eram essencialmente forçadas - pois o que ele gostava era de estar no "centro da discussão". Mas teve que se ir adaptando quando teve que abandonar certas posições (o cardo de Lorde do Almirantado, depois de ter perdido o cargo de Primeiro-Ministro após a vitória). Sabemos que era um homem difícil, com temperamento muito irascível e que durante a guerra o seu feitio se tornou por vezes insuportável! As paragens que a pintura lhe proporcionava, tornavam-nos mais tolerável! Ele sabia aproveitar bem essas paragens - importantíssimas para o acalmar e centrar. 

Recuar…

Como estudante Churchill terá apreciado desenhar e sentia-se orgulhoso disso. numa das suas cartas à sua mãe, datadas de 1890, escreveu: "o pai disse que pensava que cantar era uma perda de tempo, por isso saí da aula de canto e comecei a desenhar". Estudava desenho durante uma hora extra todas as semanas, à noite, e tinha estado a desenhar "paisagens e pontes e esse tipo de coisas". Estava agora pronto para começar a sombrear em sépia. Churchill tinha então treze anos. 

Só aos quarenta anos é que teve a sorte, no meio do lazer maldito que se seguiu à sua partida do Almirantado, de retomar o desenho. Numa das mais comoventes das suas recordações, que publicou pela primeira vez como artigo de revista nos anos 20, escreveu: 

"Quando deixei o Almirantado no final de Maio de 1915, ainda era membro do Gabinete e do Conselho de Guerra. Nesta posição eu estava por dentro de tudo e não podia fazer nada. A mudança das intensas actividades executivas de cada dia de trabalho no Almirantado para as tarefas estritas de um conselheiro deixou-me apegado. Como uma besta marinha pescada das profundezas, ou um mergulhador subitamente içado, as minhas veias ameaçavam rebentar da queda de pressão. Tinha grande ansiedade e nenhum meio de a aplacar; tinha convicções veementes e pequeno poder para lhes contornos. Tive de assistir à infeliz eliminação de grandes oportunidades e à fraca execução de planos que eu tinha lançado e nos quais acreditava sinceramente. Tive longas horas de lazer totalmente despojadas para contemplar o desenrolar assustador da Guerra. Num momento em que cada fibra do meu ser estava inflamada para a acção, fui forçado a permanecer um espectador da tragédia, colocado cruelmente num banco da frente. E foi então que a «Musa da Pintura» veio em meu socorro - por caridade e por causa da criança, porque afinal não tinha nada a ver comigo - e disse: «Será que estes brinquedos lhe servem para alguma coisa? Eles divertem algumas pessoas»". 

Parece trágico o que nos conta Churchill, forçado a parar, quando havia tanto a fazer! Mas a sua «Musa da Pintura» encheu a sua alma e bem poderia ter sido um pintor profissional pois pintava com grande qualidade. 

Tal como Churchill tantas vezes vez com as suas telas, há que recuar para ver bem que “quadro” se está a fazer. É isso que dará a perspectiva do todo. Aí, nesse afastamento, podemos ver se o que pensámos seria a nossa obra; se ela está a sair como queríamos; que mudanças fizemos; contemplar o bom que fizemos; o bonito que o talento nos permitiu fazer; enfim os erros a corrigir.

Na velhice Churchill terá dito ao seu médico Lorde Moran que não acreditava noutro mundo; apenas em "veludo preto, sono eterno"O seu último Secretário Privado, Anthony Montague Brown, descreveu-o como "um agnóstico optimista".

Não falaria Churchill com Deus... pelo menos pelas suas palavra... E mesmo assim, quem saberá dizer ao certo?!        

          O que é que tenho a agradecer a Deus neste último mês?

O que é que eu fiz de bom com a vida que Deus me deu neste último mês? Como foi a minha relação com os outros, na família, no trabalho, nas outras actividades?

Sobre o que é que devo pedir perdão?

Reflectir e decidir

Disse Churchill: "O trabalho precipitado e as decisões prematuras podem levar a sanções desproporcionadas em relação às questões imediatamente envolvidas”. 


Reflectir sobre a sua vida é tomar posse dela. Todo o esforço do homem para se tornar mais homem aproxima-o do Pai, que o deseja plenamente consciente e livre.
 

O que é mais importante para mim?

Imaginando que a minha vida é um jardim, o que precisa de ser regado?

Que ervas daninhas precisam de ser cortadas?

O que preciso de colher?

O que preciso de semear?                                  

Agradecer pelo dom da vida

Tenho para mim que a fé é muito importante e que temos que aproveitar as paragens para agradecer a Deus do fundo do coração pelo enorme dom da vida e por toda a vida que temos em aberto - pelo fantástico que ela poderá ser! 

Churchill era um homem que amava a vida e não deixaria de dialogar com a sua consciência. Era um homem de carácter, embora de feitio difícil. Paz à sua alma!

E tu, sente-te em paz com Deus, sabendo que és um seu filho muito amado. E oferece-lhe este momento.

Texto com contributos de:

 "In Search of Churchill", de Martin Gilbert (Harper Collins); 

https://www.bbc.com/news/uk-politics-31517640

https://www.dailysabah.com/arts/winston-churchills-landscape-painting-of-morocco-sells-for-7-mn/news 

https://www.alistairlexden.org.uk/news/did-churchill-believe-god


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