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A mostrar mensagens de julho, 2019

Num mundo onde os únicos sonhos permitidos são os que se podem comprar

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"Num mundo onde os únicos sonhos permitidos são os que se podem comprar, a felicidade passou a ser apenas um atributo da posse. A realização pessoal, que é - ou deveria ser - o caminho de qualquer vida, já só consiste perversamente na resignação e na sujeição. Realizo-me adaptando-me, executando os gestos dos outros sem nunca me interrogar. Realizo-me, não me realizando, porque a sociedade não me permite mais nada, porque só tenho duas pernas, curtas, e não vejo asas a despontar em parte alguma do meu corpo. Mas será mesmo assim ou será apenas um álibi, uma forma de preguiça mental? Basta parar por um instante e observar o mundo da natureza que nos rodeia para se ver que tudo fala da gratuitidade inquietante, da fragilidade e da beleza das formas vivas. Embora tentemos viver em caixas hermeticamente fechadas, o mistério resplandece à nossa volta e sugere-nos o caminho a percorrer. Não existe mediocridade, monotonia. O que existe é apenas o nosso medo. Medo de crescer,

De regresso a casa

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1.  Depois de desembarcado na Gare do Nord e despachadas as minhas malas por um serviço de grumetes, resolvi calcorrear a cidade ao longo do Sena, na demanda da minha morada. Naquela tarde, uma luz agradável dava brilho ao edificado regular e de singela beleza, nos seus tons ocres. Fui então invadido por uma paz interior e um contentamento transbordante, espelho desta cidade de Paris, que tem a virtude de arrumar a alma e nos fazer acreditar num futuro radioso. Saltava de alegria e, na verdade, mal pude contê-la se não no final do dia, quando me sentei na escrivaninha da minha água-furtada, para escrever a meu querido pai: chegara bem, sentia-me nas nuvens!  Aqui, uma nova etapa da minha vida se abria, e não esperava nada menos do que me tornar no pintor que sempre em mim falou mais alto e que todos os meus gestos desde os meus 7 anos apontaram que me tornaria. Iria estar então entre os melhores. Mas isso não me assustava porque eu não escolhera uma ocupação. A pintura, o dese

Os véus de Lisboa

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O Príncipe de Lampedusa escreveu o seu Leopardo como testemunho dum mundo desaparecido: a sua Sicília que a destruição da guerra e uma nova geração de dirigentes veio mudar para nunca mais nada ser igual. As leituras sobre Lampedusa e sobre a Sicília têm o condão de em mim me fazerem amar mais estas cidades antigas como Lisboa. Há também em Lisboa um fundo antigo, um quê de passado que subjaz ao nela nos passearmos. Os seus telhados e o Tejo sempre cambiante, recordam-nos que é uma terra de chegadas e partidas, que é uma cidade portuária, que evoca lonjuras: tanto as geográficas como as lonjuras dos tempos antigos. Esses telhados são as velas das embarcações que se fazem ao mar. Ontem, pelo Chiado percorria os livros dos alfarrabistas. Fixei-me num livro que evocava o Chiado de antigamente. Muito mudou, mas ainda se encontra algo desses tempos, uma certa classe e distinção. Basta-nos entrar naquelas salas chiques do Turf e tentar-nos transportar para esses tempos, ou mesmo avi

Tom Sawyers advogados e a alegria

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Quando alguém disse que aquele jovem se tinha tornado advogado, ninguém queria acreditar. Era dos tais que não parava quieto, que andava sempre a inventar aventuras e que gostava muito mais de explorar rios e canaviais, do que estar sentado no espaço confinado duma sala de aula. A questão mais importante a colocar era a de saber se esse seu "adestramento" tinha sido feito à custa de castigar os seus ímpetos libertários e de os sujeitar à disciplina férrea, ou se antes advinha de um crescimento interior: o mesmo é perguntar, se seria tal qual leão enjaulado, que ansiava o dia em que poderia correr pela savana, ou se se mantinha uma pessoa alegre, feliz. Há pessoas que estão bem diante do papel, sentados à secretária. Que sempre foram pessoas concentradas. Num extremo, estas pessoas são "amorfas". Sid, o irmão de Tom era mais assim. Há outras pessoas que estão bem no mexer-se, que não conseguem estar paradas. Num extremo estas pessoas são "hiper-activas