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A mostrar mensagens de agosto, 2022

Um dia estranho

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                                            Faz agora três anos creio, peguei em mim e fui. Fui para o fora, para os campos doirados. Meti-me num combóio, vi o desfilar das paisagens, fiz-me testemunha de conversas dum grupo, de coisas importantes, de como viver em conjunto, fazer planos. Encontrei-me ainda cara-a-cara com outras pessoas, pessoas generosas que se fizeram presença: Ema, professora universitária; José, ex-paraquedista.  Percorri um espaço de paz nesse Convento da Flor da Rosa e aí soltei um pássaro que estava aprisionado numa torre, sem conseguir sair em liberdade. Com coragem, peguei-o com as minhas mãos e pu-lo a voar. Nas minhas mãos, que o prenderam para o soltar, colaram-se penas, algumas penas do aflito animal.  Trovejou, choveu - o dia estava estranho.  Foi boa a conversa com o José, apesar do cansaço para as despesas da mesma; falou-me dos seus amigos, de gente importante do direito e da economia. Falou-me das suas imperfeições, afinal das imperfeições dos hom

Capacidade de tomar decisões

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Já tive que tomar muitas decisões difíceis na minha vida . A questão da ida para o  seminário  foi capaz de ser uma das mais difíceis, assim como quando dela desisti; a questão dos  Leigos para o Desenvolvimento , sobretudo a decisão de não ir em missão foi uma decisão também difícil bastante difícil. Considero que tenho uma certa dificuldade em decidir . Uma das razões é porque não vejo as coisas muito claras. Outra é porque sou também um pouco sonhador (e isto pode significar um certo problema em explicar aos outros, de forma racional, o que me levou a tomar certa decisão). Outras vezes é porque estou a pensar em muitas coisas ao mesmo tempo e fico confuso.  Façamos como que uma ontologia do acto de decidir. A capacidade de tomar decisões aumenta com:  - estado psicológico equilibrado e pessoa tranquila; - auto-confiança; - tempo para decidir; - ter alguém que nos possa ajudar a reflectir, escrever; - quando se trata dum assunto pouco complexo; - não haver problema em não optar por

Fluir ou a "experiência óptima"

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Antes de ir de férias estava cansado e tinha planos de permanecer em modo repouso por todo um mês. Estive na fantástica Sintra, fui a banhos â praia, passeei na Serra, estive com amigos, fui a jantares. Depois, rumei a Lisboa, apenas para desfazer uma mala e fazer uma outra e parti com destino ao Alentejo. Manhãs bonitas, banhos na piscina, corridas pelo Monte ao fim do dia, almoços e jantaradas, um passeio a Mérida. Foram assim cerca de 19 dias, entrecortados apenas por alguns emails e poucos telefonemas de trabalho; 19 dias, não um mês, pois às respostas solicitadas mais antigas, foram-se somando novos pedidos.  Dia 19 de Agosto regressado a Lisboa notava-se, claramente, um espírito deprimido, ainda não totalmente restabelecido e a quem apetecia ainda brincar: há quem diga que os adultos são aquelas crianças que desaprenderam a arte de brincar... Voltava assim do recreio por força da campainha, que por mim chamava... No entanto, uns dias intensos de trabalho, casos exigentes e a que

Sentir-se em casa

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No mundo dos sentimentos a riqueza é muita, tanto que podemos identificar um que se refere ao "sentir-se em casa". É-me algo muito caro, identifico-o desde a minha primeira infância quando no Brasil comecei a tatear a vida e a fascinar-me com a "Casa Bola" (literalmente uma casa em formato esférico que ainda existe em S. Paulo), ou a rir-me com a alegre cantiga de Vinicius, a "Casa": " Era uma casa muito engraçada, não tinha tecto não tinha nada... ninguém podia fazer xi-xi. porque pinico não tinha lá.. . Mas era feita com muito esmero na Rua dos Bobos n.º 0 ".  O sítio que chamamos casa recebe-nos como amigos e dá-nos o conforto quando precisamos.  Lembro-me, quando era novo, voltar a casa depois dumas férias e sentir que tinha regressado ao chão que conhecia. É bom viajar, mas é bom também voltar. Somos assim, feitos de idas e regressos, neste diálogo sempre reiniciado. Ulisses pelas estradas, que nos trazem certo dia de volta.  A casa remete-n

L' Homme qui marche

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Por vezes debato-me com decisões que tomei no passado, esquecendo-me frequentemente do que elas me trouxeram de bom. Não ter carro é uma delas, algo que só um pensar mais detido pode permitir-nos retirar dela toda a sua riqueza escondida, pois trata-se duma medida em contra-corrente.  Este Verão, sentado na praia, um amigo perguntava-me se eu não me sentiria como que "preso" por não ter carro. Penso agora: o carro sempre me despertou sentimentos mistos, pois se me permite ir rapidamente para onde quero, por outro lado, é preciso ter muito cuidado para que não seja riscado (ou se risque e amolgue outros ao arrumar), ou com a velocidade, ou em não o  deixar em sítios proibidos (já fui rebocado várias vezes). Enfim, não ter carro é deixar também acabar com uma fonte de preocupação. A verdade é que fui mais ou menos compelido a enveredar por uma via de peão. Vivo no centro de Lisboa, numa casa sem garagem para onde me mudei há cerca de 4 anos, não tenho dinheiro para ter um carro

A relação com o nosso corpo

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A relação  que temos com o nosso corpo é um elemento importante para a nossa auto-estima.  Acumulamos mais ou menos gordura no corpo?! Olhamo-nos ao espelho e vemos o corpo tornar-se redondo, inchado?! Será isso uma ilusão?! É aqui também onde o olhar dos outros pode ser tão relevante, pois são os outros que melhor servem de espelho quando nos dizem: "estás gordinho, precisas de fazer exercício..."  Tenho uma balança na minha casa de banho e volta e meia dou-me ao exercício de me pesar. O resultado não dá grandes variações, mas parece que nunca estou verdadeiramente satisfeito pelo que vejo ao espelho e que quando me proponho a uma dieta, ou a corridas matinais, pouco ou nada muda na balança. Seriam os abdominais - que por sinal abomino que resolveriam?!  Penso que terei lido que 80% do nosso peso tem que ver com o que comemos, 20% com fazer exercício. Ou seja, "somos o que comemos". Uma dieta, para produzir efeitos, tem que custar: um primo meu faz há anos o chamad

Liderança

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Uma das coisas mais raras são bons líderes, pois eles aliam uma série de características e qualidades que não se encontram habitualmente reunidas numa mesma pessoa. Uma delas é a visão e a coragem, o que na verdade torna muitos daqueles a quem chamamos "líderes" muito mais gestores - por falta desses dois atributos. A importante responsabilidade do líder é, tal qual maestro, ter a percepção do todo, saber colocar cada um na melhor posição possível para si próprio e para esse todo, de forma a levar a que se tente "tocar" algo harmonioso, uma espécie de maestro. Para isso é preciso ter um bom conhecimento da natureza humana e dos diferentes tipos de personalidade, mas também o conseguir o respeito dos demais para que cada um toque a parte que lhe compete na "orquestra".  Sabemos que os líderes são pessoas que marcam, que deixam um rasto, porque, enquanto seres sociais, gostamos de pertencer sempre a algo maior do que nós: a um partido político que mobiliza o

Manual de Boas Práticas

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Se pudesse criar um programa específico de formação para jovens advogados o que faria? Santo Inácio de Loyola creio que tinha as chamadas "Constitutiones", um conjunto vasto de orientações que se destinam à formação dos jesuítas, formação como sabemos que é longa e exigente:  “ quam plurimi et quam aptissimi ", o mais possível dos melhores. Vou enumerar algumas questões que me parecem importantes: - Gestão do tempo e organização ; - Qualidade técnica ; -   Técnicas de resolução de problemas;  - Rigor;  Comunicação com o cliente. São tudo questões interessantes e fundamentais num bom desempenho profissional, e é verdade que algumas dessas competências podemos adquirir através da experiência. Mas podemos também dar formação nesse sentido, pois ganha-se em indicar o caminho. Gerir o tempo é muito mais do que ter uma agenda, pois a agenda não diz como devemos ocupar o tempo: há sempre que escolher. Devemos ter em consideração o prioritário e o não prioritário , o urgente e

O Américas

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Gostava de fazer a experiência de contar a quantidade de palavras que digo em certos dias, pois às vezes contam-se pelos dedos... Quando era pequeno, havia algo que me caracterizava que era o de ficar atento às conversas dos outros e de ouvir muito mais do que falar.  Não falo muito, não tenho grande facilidade para a chamada "small talk", a conversa fácil. Há pessoas que conseguem ficar horas a falar, talvez tenham boa memória para integrar factos e ideias e imaginação; mas muitas vezes falam e falam - e  pouco concretizam. Não me parece que essa minha maneira de ser se trate dum defeito ou duma qualidade, diria antes que é uma característica pessoal, nem sequer se deve à minha educação, pois tenho um irmão que é bem diferente de mim nesse particular (e um outro que ainda acentua mais esta contenção na palavra). Certos clientes meus gostam da minha economia de palavras, pois sou contido e direito ao assunto, sem grandes especulações ou floreados. Dizem que sou assertivo, que

La Seine

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A maior parte dos rios em França escrevem-se no feminino: "la Seine" ou "la Loire"... e esta história começa com um passeio dado pelo Museu d'Orsay, junto ao primeiro desses rios, onde descobri com a minha amiga Sandrine os quadros de Pierre Bonnard: ambientes de luz amarela/encarnada, quente - que eu diria terem captado esse "Eterno Feminino". Há mistério e o indefinível naqueles quadros, algo que tem que ver com o desejo, que me remete igualmente para as odaliscas de Cézanne; mas Bonnard tem um olhar próprio e singular e por isso é um "Grande Mestre".  Um passeio por um museu assim toca-nos na nossa mais profunda sensibilidade - não interessa o sítio onde estejamos e são múltiplos os lugares onde já vivemos experiências assim, mas há cidades como Paris que são pródigas.  Junto ao Sena, nas Tuilherias, a Orangerie: um surpreendente conjunto de obras reunidas por esse genial coleccionador de arte, o Dr. Gachet; ou o Museu Rodin, que nos abre

Se calhar já não te lembras, mas faz esse esforço, vais ver que te surpreenderás...

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Contam-se aos milhares os gestos de quem te foi ajudando na posição da mão ao leme, ensinando-te a colocar o barco direito, para assim vogar velozmente pelo mar.  Se calhar já não te lembras, mas faz esse esforço, vais ver que te surpreenderás... O avô que te sentou ao colo, ou quem sempre te tratou com aquele carinho especial, esperando de ti o melhor, olhando sobretudo para as tuas qualidades, como a avó que dizia que os seus netos são "lindos",  "muito inteligentes". Ou aquele padre que certo dia te diz: "tu és boa pessoa, apesar do que se possa dizer por aí" (tantos e tão bons os padres têm sido!), ou aquele professor que te dá as melhores notas - e tu sabes que te esforçaste e que é justa a recompensa.  Se calhar já não te lembras, mas faz esse esforço, vais ver que te surpreenderás... O treinador, no campo, que "puxa" por ti e que te faz orgulhares do teu nível de performance. Ou a quelas conversas que tiveste com o teu pai, em momentos de

Menina à beira-mar

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Gosto de andar assim descalça pela beira-mar ao chegar à praia - a areia molhada e o vento a bater-me na cara, ainda é de manhãzinha. Está tudo calmo, apenas se ouvem mais algumas crianças a brincarem junto à espuma. Lá ao fundo, vejo uma veleiro, de velas brancas desfraldadas. Tenho 8 anos, chamo-me Leonor, o meu pai chama-se António e a minha mãe Lúcia. Vivemos em Sevilha, temos uma linda casa, com um jardim de buchos, com 3 pavões para efeito e graça que se passeiam por lá e canteiros de rosas, cuidadosamente tratadas. Antes de virmos para cá, mesmo antes das férias começarem, passámos ao andar de baixo: um pátio enorme ao centro com uma fonte e onde é tudo mais fresquinho. Adoro aquele som da água a sair da fonte e adormeço muitas vezes enquanto escuto essa agradável música.  O meu pai é muito querido e gosta de coleccionar arte na nossa casa - da última vez que comprou um quadro perguntou-me se eu achava bonito. O andar de cima da nossa casa em Sevilha, onde estamos durante quase

Janelas para fechar

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Poucas vezes faço o exercício de me sentir amado por Deus, vendo-me como criatura posta no jardim para gozo pleno da vida.  Acordo frequentemente com a sensação de que falta algo, o sentimento de que o trabalho é muito e o tempo  escasso - que fico sempre muito aquém do que pretendia fazer.  Um mero exemplo: trouxe para férias cerca de 7 livros e foram já vários os que abri e comecei a ler, mas que não me prenderam a atenção: vou assim deixando livros abertos, tal como janelas no meu computador, até me aperceber que, a "páginas tantas", tenho cerca de 10 diferentes janelas abertas (10 livros abertos...) Com isto, pode dar-se o caso de não conseguir levar nada para diante.  Depois, quanto ao tempo, também acabo por ir ficando com uma sensação de que, mesmo em férias, o tempo é escasso - o que é muito estranho porque pensávamos que em férias teríamos tempo para tudo. Ora, não é bem assim: em férias continuamos a ter que fazer escolhas e a gerir a nossa agenda. O problema não é

A oração, essa bússola interior

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Ouvia há tempos o Pe. Mário Azevedo dizer numa missa que a vida do Papa deveria ser terrível, um homem com a idade dele (85 anos), doente (sem um dos pulmões), com um dia-a-dia imparável de compromissos. É generosa, muito generosa a vida de alguém como o Papa, um homem que poderia já estar a descansar; foram generosas vidas como a de Charles de Gaulle, que eu tanto admiro e sobre quem há pouco tempo passou um documentário na televisão: uma entrega e uma abnegação em nome dum ideal (dizia-lhe às tantas André Malraux: " os nossos combates são profundamente espirituais "); ou vida de entrega de Abraham Lincoln, esse grande presidente da América que viveu os tempos mais cinzentos e conturbados da sua história, com uma terrível guerra civil que não lhe deu descanso.  Termos tempo para nós é algo muito importante, sobretudo se temos uma vida muito agitada. Aliás, nós bem vemos como Jesus Cristo precisava de regularmente se afastar, apesar de dizer que " as raposa

Complexidade crescente

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Há uns anos li uma magnífica biografia sobre Antoine de Saint-Exupéry, que era uma personalidade ela própria rica e complexa.  Pelo que me lembro, as suas relações eram algo atribuladas, era uma pessoa de carácter difícil, um artista que, como muitos, tinha algo de "antropofágico": uma insaciabilidade que, não raro, pode devorar as vidas à volta, tal como vampiro que se alimenta do sangue de quem apanha pelo seu caminho, por vezes de quem está mais próximo... Antoine de Saint-Exupéry gostava de compreender a personalidade das pessoas através da análise da sua caligrafia, o que é de alguma maneira invulgar. Mas, do que me recordo sobretudo de guardar é que ele dizia que, associado à verdadeira dimensão das pessoas, está serem pessoas complexas. Dizia ele, que as pessoas maiores eram também sempre pessoas complexas, de leitura difícil. Gosto da imagem da borboleta ou da rã para ilustrar este mesmo ponto. A metamorfose que estes animais sofrem é sempre no sentido de se tornarem