Manual de Boas Práticas

Se pudesse criar um programa específico de formação para jovens advogados o que faria? Santo Inácio de Loyola creio que tinha as chamadas "Constitutiones", um conjunto vasto de orientações que se destinam à formação dos jesuítas, formação como sabemos que é longa e exigente:  “quam plurimi et quam aptissimi", o mais possível dos melhores.

Vou enumerar algumas questões que me parecem importantes:

- Gestão do tempo e organização; - Qualidade técnica; -  Técnicas de resolução de problemas; - Rigor; Comunicação com o cliente.

São tudo questões interessantes e fundamentais num bom desempenho profissional, e é verdade que algumas dessas competências podemos adquirir através da experiência. Mas podemos também dar formação nesse sentido, pois ganha-se em indicar o caminho.

Gerir o tempo é muito mais do que ter uma agenda, pois a agenda não diz como devemos ocupar o tempo: há sempre que escolher. Devemos ter em consideração o prioritário e o não prioritário, o urgente e o não urgente para gerir. 

Os critérios de decisão na gestão do tempo dependem naturalmente do que para nós é mais importante e de percebermos qual a nossa missão. O nosso trabalho serve a quem? Quem são os nossos clientes? O que é que eles mais valorizam? Normalmente, recorre-se a um advogado para se resolver problemas, por isso um bom advogado é quem consegue resolver os problemas de uma maneira eficiente e competente. Está tudo naturalmente interligado: acaba por ser uma série de fios que se interligam uns aos outros para dar um resultado final. Uma definição de advogado é dada pela seguinte frase: "tem jeito para lidar com problemas difíceis e para lidar com pessoas".

Por falar em organização de tempo, há ferramentas que podemos utilizar: ter um documento/quadro que apresente todos os processos e o estado de cada um deles e ir trabalhando os vários processos p.e. Ou ter rotinas de organização da semana (à 2.ª feira por exemplo), ou mesmo rotinas diárias: todas as manhãs olhar para o que iremos fazer ao longo do dia (que há quem chame o "daily"). Gerir bem o tempo é uma das ferramentas mais importantes e também das artes mais difíceis. Depende também de nos conhecermos a nós próprios, como funcionamos, como trabalhamos melhor (há essencialmente 3 biorritmos diferentes). Gerir o tempo é importantíssimo não apenas para as actividades, como para o lazer e o descanso, pois o descanso reequilibra-nos e torna-nos pessoas mais eficientes. Pensar bem requer que estejamos fisicamente bem, que tenhamos um tempo de qualidade e que não andemos a correr. 

A qualidade técnica que se pode ter depende naturalmente de estudarmos os assuntos. Como dizia o prof. Adriano Moreira, ter uma licenciatura é ter uma "licença para estudar". Devemos, assim, procurar preparar e aprofundar os assuntos. Por vezes é advogando que vamos realizando esse estudo (a "experiência é a madre de todas as cosas", como dizia Duarte Pacheco Pereira) a propósito dos casos que temos e pode ser interessante, em cada caso que tenhamos, ir "repescando" os casos anteriores que tivemos onde se colocaram os mesmos problemas; mas se identificarmos as áreas em que trabalhamos, podemos sempre tentar pensar em como ir completando o nosso conhecimento. Em todo o caso, aqui também, trata-se essencialmente de ir criando um "aprendizado" de experiência: tal como na aviação, podemos criar uma espécie de "cartilha" e de "check-ups" de procedimentos, i.e., standardizar procedimentos (p.e. para uma escritura de compra e venda duma casa, precisamos destes documentos e o processo passa por isto e por aquilo). Há assim metodologias que podemos criar que tornam a nossa abordagem menos passível de erro. Ou podemos também olhar para as minutas que temos e desenhar uma minuta para um tal contrato que seja o resultado das melhores que já fizemos (na verdade tenho uma espécie de pasta onde guardo o "best of the best").

As técnicas de resolução de problemas são por exemplo esquemas que sistematizam a complexidade dum determinado caso, vendo-o de diferentes prismas. Dão algum trabalho, mas traduzem-se numa forma muito útil de "enfrentar o elefante" cortando-o aos bocadinhos: torna-se assim muito mais fácil "tragá-lo" aos bocadinhos. Arranjamos assim uma espécie de estratégia de acção, para casos que são na realidade problemas com várias faces.

O rigor passa por apresentar a solução dos casos de forma correcta do ponto de vista jurídico e técnico, indo ao detalhe. Pode ser um trabalho de paciência, mas como se diz a "perfeição está nos detalhes" e assim também se evita o erro e se assegura maior segurança jurídica. Isto passa pela revisão do trabalho, talvez mais do que uma e outra vez. E mais vale também às vezes dizer que se vai estudar o processo do que dar respostas rápidas e em cima do joelho. O estudo deve fazer parte do trabalho do advogado. 

Finalmente a comunicação com o cliente: muito importante manter constantemente informado o cliente para o deixar sossegado de que o trabalho vai ser feito. A comunicação deve ser regular e clara.

Ora são tudo dinâmicas variadas, que se cruzam e interligam e que ganham sempre que sejam vistas com casos particulares.


 

   

 


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