Capacidade de tomar decisões

Já tive que tomar muitas decisões difíceis na minha vida. A questão da ida para o seminário foi capaz de ser uma das mais difíceis, assim como quando dela desisti; a questão dos Leigos para o Desenvolvimento, sobretudo a decisão de não ir em missão foi uma decisão também difícil bastante difícil.

Considero que tenho uma certa dificuldade em decidir. Uma das razões é porque não vejo as coisas muito claras. Outra é porque sou também um pouco sonhador (e isto pode significar um certo problema em explicar aos outros, de forma racional, o que me levou a tomar certa decisão). Outras vezes é porque estou a pensar em muitas coisas ao mesmo tempo e fico confuso. 

Façamos como que uma ontologia do acto de decidir.

A capacidade de tomar decisões aumenta com: 

- estado psicológico equilibrado e pessoa tranquila; - auto-confiança; - tempo para decidir; - ter alguém que nos possa ajudar a reflectir, escrever; - quando se trata dum assunto pouco complexo; - não haver problema em não optar por aquela decisão e não nos importarmos com o que os outros possam achar; por seu turno, a capacidade de tomar decisões  diminui com: - cansaço, falta de sono; estados deprimidos (em que há como um condicionamento racional); confusão mental por ter muitos assuntos para decidir; - isolamento; - pressão externa para decidir (pode levar ao bloqueio); - preocupação pelo que os outros possam achar.

Dizem os jesuítas que as decisões precisam de ser discernidas. Em princípio, se ela nos derem paz e consolo, isso significa que acertámos.  

Mas, para me ajudar a pensar mais aprofundadamente sobre o assunto, fui à procura dum vídeo que falasse sobre o assunto. E assim, acabei de ver uma Ted Talk extraordinária de Ruth Chang (esta Ted Talk está disponível em https://www.youtube.com/watch?v=8GQZuzIdeQQ; mais informações sobre esta autora em: https://www.ruthchang.net/outreach).

Essencialmente, ela diz que o problema das decisões difíceis é que nós achamos que não conseguimos tomar uma decisão porque somos estúpidos (aquilo que mais acima eu referi...). Pomos numa folha de papel os prós e os contras - e não conseguimos decidir. Ora, as decisões difíceis (e podem ser pequenas como a escolha do pequeno almoço, como grandes decisões tipo a escolha duma profissão, se viveremos no campo ou na cidade, se casamos com A ou com B) são justamente aquelas em que ambas as decisões são boas e em que não é possível chegar a um resultado matemático. É que aqui para decidir preponderam valores que não são mesuráveis: o valor da justiça, do bem, da pessoa que eu sonho ser (a tal questão do ser "sonhador" é justamente essa, a de colocar na equação a pessoa que eu sonho ser). 

Realmente, ela tem toda a razão pois há decisões que são muito difíceis, mas que são pouco importantes. Por exemplo, a escolha do sítio onde iremos de férias. Eu próprio perco habitualmente muito tempo nessa escolha, porque há sempre inúmeras boas opções. A mesma coisa com ler um livro: há sempre muitos livros que podemos ler, todos eles com uma mensagem importante.

Diz-nos Chang que é muito importante "pôr-nos" atrás da decisão e ver que futuro quero construir. É aí que somos muito mais autores da nossa vida, sendo a decisão é como que um processo auto-constitutivo do que queremos ser. Por exemplo, ver-me-ia a viver no campo? Vejo-me como pessoa capaz de estar isolado, sem o contacto com a cultura e o movimento da cidade?

Hoje em dia por exemplo é difícil viver na cidade de Lisboa. As rendas estão altas. Em comparação, viver numa cidade do interior ou mesmo no campo pode ser muito mais barato. No entanto, lá não temos a nossa rede de afectos, ou a vida é muito mais parada. Poderia ir viver para uma cidade tipo Évora, seria muito mais barato certamente. É uma cidade e uma região muito bonitas. Até poderia trabalhar à distância e vir uma vez por semana a Lisboa. Seria possível sim. Lisboa, é muito cara, hoje em dia está confusa, mas eu gosto muito de viver aqui.     

Muitas vezes quando é assim, isto é, quando ambas as decisões podem ser boas - e temos dificuldade em chegar a um resultado, acabamos por optar pela decisão mais segura. No caso dela, indecisa entre uma carreira de filósofa e de advogada, acabou por decidir por esta última por achar que era mais segura (bem percebo essa sua hesitação, eu próprio, advogado, sempre senti um grande fascínio pela filosofia mas achei que seria um caminho difícil). Ela "não se sentia advogada", considerava que não se encaixava bem na sua pele (tipo fato que vestimos), optou por abandonar essa carreira e seguir outro caminho, justamente o de se pensar em como tomamos decisões. Eu próprio também por vezes duvido que me apaixone o que faço, embora procure um estilo de advogar que seja o mais consentâneo possível comigo: tenho jeito para as relações humanas (é quase uma espécie de diplomacia), gosto de estudar e argumentar. Há algo de simbólico que não gosto na profissão de advogado, não sei bem o que é e não adoro dizer-me advogado, não tenho especial orgulho nisso.

Conheço pessoas muito corajosas, como um amigo, o Nuno Sá, que decidiu por uma área totalmente diferente do Direito: é agora mergulhador sub-aquático, fotógrafo premiado e realizador de filmes. Mas optou por o que seria menos óbvio. Diz ele que o Direito foi um erro de "casting", o fato que pior lhe servia.

Mas é isso, quem queremos ser? Que tipo de pessoa?! O que queremos deixar de legado para que falem de nós no futuro? Onde nos vemos dentro de 5/10 anos?

A hipótese de viver numa cidade como Évora, seria interessante se eu tivesse um projecto que quisesse desenvolver por lá. Vamos imaginar que eu queria tornar-me político em Évora, abraçar um desafio de dinamizar aquela cidade que é um tanto ou quanto um "marasmo" cultural, procurar desenvolver do ponto de vista económico, social. Ou trabalhar intensamente no projecto Évora cidade candidata a Capital Europeia da Cultura. 

É aí justamente que entra aquilo de que fala Ruth Chang: as decisões que podemos tomar para nos tornarmos a pessoa que queremos. Devemos tomar em linha de conta isso, pois é demasiado simplista colocar numa folha de papel os prós e os contras (pois não sairemos do impasse) e errado optar pela decisão mais segura. Como diz Cat Stevens: I was once like you are now/And I know that it's not easy/To be calm when you've found/Something going on/But take your time, think a lot/Think of everything you've got/For you will still be her tomorrow/But your dreams may not ("Father and Son").


















Rodin, "Le Penseur", Museu Rodin, Paris



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