Diferenças culturais

Julgo que a riqueza da Europa se faz da sua diversidade. No outro dia comentava as palavras do meu amigo José Sarmento de Matos que me disse já por várias vezes que os portugueses são dentro da Europa os comunicadores por excelência. Vem-nos isso da nossa posição geográfica, como finisterra, local onde se fixaram povos porque não havia mais para onde ir: o grande oceano é um abismo difícil de suplantar; no entanto, em terra firme, um clima soalheiro e temperado e um ambiente simpático para se viver; na expressão da outra senhora, "um jardim à beira mar plantado". Dá preguiça sair de Portugal, é mais fácil ficar do que sair. Uma terra assim, não é um local de passagem, mas de fixação, de sedimentação.  

Naturalmente que hoje, com os aviões, circulamos facilmente por todo o lado e que a nossa posição periférica se atenuou. Mas o substracto cultural dum povo que se habitou à diversidade e ao diálogo ficou-nos. É surpreendente o número de portugueses em posições de grande relevo internacional: António Guterres é o exemplo mais notável. Mas pensemos em Jorge Sampaio, que foi Alto Representante da ONU para o Diálogo de Civilizações. Somos um país que comunga dos valores europeus, a sua génese tem que ver com a Europa mesmo. Cá estiveram os romanos, nascemos dos cruzados e do Cristianismo, estivemos no mundo, vivemos os movimentos culturais europeus: o Iluminismo e o Liberalismo. 

Esta semana vi um documentário sobre Maria de Lurdes Pintasilgo. Ela foi dos primeiros portugueses a se destacar internacionalmente neste quadro do Multilateralismo, trabalhando ao mais alto nível na Unesco. 

Faço um forte contraponto entre países marítimos e países continentais. Portugal, Reino Unido, Holanda e Dinamarca são nitidamente atlânticos. São povos de influência, de persuasão.
Espanha, França e Alemanha são nitidamente marítimos/continentais. São povos dominadores, de força.

Itália é um misto: é continental e é marítima. Como em tudo, os italianos são especiais. Génova, Veneza e Nápoles marítimas; Milão e Turim continentais.

Creio que o desafio de cada país é perceber um pouco as suas idiossincrasias. Adriano Moreira fala de Portugal como um "Estado Exíguo" e, na realidade, sempre procurámos fora alianças. Foi muito curta no tempo a nossa auto-suficiência e quase sempre tivemos que encontrar aliados na Europa.

Inglaterra no passado teve um Império, dominou os mares, Rule Britannia; mas penso que nunca se esqueceram que era sobretudo através da persuasão - e não pela força, que conseguiam manter esse império. Não deixaram até de usar de um certo cinismo e há muitíssimo exemplos disso, veja-se por exemplo o que aconteceu na Índia e no Paquistão (tentavam seduzir com a pompa e circunstância, tão típicos, mas jogavam muito nos bastidores). Agora passam pelo Brexit e revela-se em bom rigor a dificuldade que terão nos anos vindouros até chegarem a um novo equilíbrio. Conseguirão?!

Estive recentemente entre a Holanda e a Alemanha. Países e culturas muito diferentes. Ilustram claramente a diferença entre um país marítimo, de comerciantes e um país continental, de indústria. Enquanto na Holanda é o empreendorismo (que junta criatividade e espírito prático), na Alemanha é a organização, a consistência. Vê-se porque são os alemães e Merkl que mandam na Europa: eles não brincam quando trabalham. São fiáveis e os melhores preparados para conduzir.

Há quem diga que os Países do Sul têm uma ética pior que os do Norte. Eu diria diferente. 

A chamada "Dieta Mediterrânica" é um legado cultural do sul da Europa, onde Portugal também se insere. Uma das características desta dieta é que, além dum conjunto equilibrado de alimentos e do uso moderado do vinho tinto, se celebra o convívio na alimentação e o estar-se junto à mesa. Isso é um valor civilizacional de grande importância. Os países do sul da Europa celebram o convívio. No Norte da Europa, este é um contributo que eles recebem e que agradecem: é a vida para o trabalho ou o trabalho para a vida?!


Portugal como terra do convívio, Lisboa como cidade da tolerância. Será por acaso que a Fundação Aga Khan nos escolheu como sua sede? Somos um país cristão, mas aceitamos e promovemos a diferença. Não impomos a nossa verdade, é aquilo que Jaime Cortesão chamava "a plasticidade amorável do povo português". Podemo-nos sentir felizes por nos terem escolhido a nós. Viram certamente qualidades em nós para nos escolherem. Não será essa convivialidade, essa tolerância, essa "plasticidade amorável"?! E não é uma das razões porque tantos expatriados gostam de viver entre nós?!

Não foi essa a razão porque Calouste Gulbenkian gostou de cá viver?! 



    





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