BuRRocracia

1. Diz-nos Hugo de Azevedo nas suas "Lições do burro" (Quadrante, 2014, S. Paulo, Brasil): "... É muito antigo o hábito de extrair dos animais lições para os homens. E com toda a razão, visto que, além de sermos seus irmãos, como criaturas de Deus e eles nossa companhia nesta vida terrena (e quem sabe se na outra), foram feitos de tal modo que nos servem de caricaturas. Por mais estranhos que se nos apresentem, há entre eles e nós semelhanças cómicas, directas, subtis ou brutais, que nos interpelam".

A imagem do burro está carregada de sentidos. Creio que na maior parte das vezes de carga negativa. No entanto, se pensarmos bem, o burro é um animal que nos pode inspirar simpatia: é um animal esforçado, humilde, cumpridor - se bem que com o seu "feitiozinho"! 

Vários autores no passado já exaltaram a figura do burro. Josemaria Escrivá na santificação do trabalho - não sem bastante humor a ele recorria. Volto às "Lições do burro": "sempre o mesmo passo, sempre as mesmas voltas um dia e outro. Todas iguais. O jumento é animal de rotinas. E o homem também. E o sol. Mais a lua. Os astros, as estações, os combóios, o lar, o trabalho, o descanso... A vida é começar e recomeçar. Sejamos sinceros: nós gostamos e precisamos da repetição e da ordem. Também gostamos de variar, mas dentro de uma rotina. A rotina só é má se formos rotineiros no mau sentido da palavra, isto é, se trabalharmos por inércia, distraídos do que fazemos, e então cada vez mais atabalhoados".

2. Na minha profissão de advogado há uma expressão que gosto de utilizar: "albarde-se o burro à vontade do dono", para com isto significar a aleatoriedade/arbitrariedade de determinadas exigências, a mais das vezes impostas pela Administração Pública  (repare-se que se diz "à vontade do seu dono", não "à sua vontade", o que uma vez mais, reforça que o burro não é responsável...). Além disso, possível fazer um jogo com a quase correspondência ortográfica entre as palavras "burocracia" e "burrocracia" e retirar daqui valiosas lições também. Creio que há um princípio psicológico que as aproxima intimamente: teimosia. É muito difícil convencer um burro/um burrocrata a ir por onde não quer. O burocrata deve ter como máxima o interesse público, aí é bom que seja teimoso, muito teimoso. Mas por vezes, o burrito jovem que era simpático, acumula vícios e estatutos e torna-se "mula velha". 





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