Tivoli, Memorias da Avenida

Há uma herança que os que nos precederam deixaram e que é tão importante quanto as coisas físicas que nos passaram. Uma forma de estar e de cuidar do mundo, de olhar para e por ele. É um património imaterial, se quisermos "espiritual".  
O livro "Cinema Tivoli, sobre a história de mais de 50 anos desta sala emblemática de Lisboa, é uma homenagem sentida - e agradecida - a tantos que foram "humildes servidores" da beleza e das artes.
Antes de mais aos artistas, àqueles que fizeram sonhar, tornando as vidas daqueles que assistiram aos seus espectáculos, nem que seja por alguns instantes, lugares habitados pela poesia. Na efemeridade dum espectáculo somos por vezes visitados pelos anjos. Lembremo-nos do filme "Rosa Púrpura do Cairo", de Woody Allen, em que acontece o impossível:  a espectadora entra para dentro do filme, impulso que muitas vezes é o nosso, mas que, na realidade, se torna a metáfora por excelência de toda a grande obra de arte.
Menuhin ou Rubinstein foram dois desses magos que passaram pelo Tivoli.
Sob o signo das rosas - um bouquet de 4 rosas - o meu bisavô, Frederico de Lima  Mayer, quis distribuir rosas - aquela que era a sua paixão - a uma Lisboa bem diferente da dos nossos dias. Dizia-nos dele Leitão de Barros: "vejo-o ainda, calmo, acolhedor, modesto, com um ar distraído e alheio, entre os seus roseirarais predilectos, ou no escritório deste cinema, que vira nascer desde a primeira pedra e ao qual se dedicava fiel como um grande senhor ao seu castelo.
O meu avô Augusto, seu filho, de que eu guardo a memória duma pessoa que, junto com a minha avó, nos ensinaram que as coisas boas na vida não se entregam aos preguiçosos mas que se constroem com persistência e empenho, seguiu e dinamizou mais ainda o trabalho de seu pai.
O Cinema Tivoli é prova vivida de que uma qualquer instituição é o resultado de muitos e diversificados contributos e de ressonâncias que vão ficando e lhe dão identidade. 
A Marquesa de Cadaval foi um desses contributos, importantíssima como mecenas.
Mas muitas ressonâncias também: João Benard da Costa e Jorge Silva Melo são duas delas.
Do fundo duma gaveta numa cómoda de casa dos meus avós em Sintra, o João Monteiro Rodrigues e eu fomos tentando deslindar a história do Cinema Tivoli, a partir de mais de 100 fotografias desses espectáculos que foram remetidos para o funda da memória, para o tal fundo da gaveta.
Desfiando os anos, abordando testemunhas desses anos, conversámos com Germana Tânger, Ana  Máscolo, Patrick Hurde, Diogo Lino Pimentel, José Castelo-Lopes. Já quase nenhum deles está mais entre nós... Passo a passo, com o contributo de vários autores que sabiam mais do que nós, "entregámos" o trabalho final, sob a forma de publicação dum livro.
O José Sarmento Matos acompanhou-nos nesta aventura, alguém que tinha o condão de nos ajudar a olhar para as pedras e as pessoas desta cidade de Lisboa como uma fascinante história... à espera de voltarem a ter vida!

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