Uma andorinha não faz a Primavera

Ontem à noite assisti a vários programas "Visita Guiada" da Paula Moura Pinheiro. Dois deles sobre D. Pedro IV e o Porto. 

Fica um travo triste desta história das guerras do séc. XIX e todas estas aventuras e desventuras dum País cuja corte tinha "enxameado" para o Brasil e que depois se guerreia entre facções. Um príncipe que se reclama Imperador do Brasil e que se bate com seu irmão e cuja morte, aos 36 anos de idade, deixa seu filho ao Brasil, o seu coração à cidade do Porto e o corpo a Lisboa.

Conta-se que o seu filho, D. Pedro II do Brasil,  quando vira a sua mulher - cujos arranjos matrimoniais a trariam  Europa para o Brasil, ficara decepcionado e que não quisera casar com ela. D. Pedro IV de Portugal, mais tarde, D. Pedro Imperador do Brasil, dissera-lhe que não tinha opção e que teria que casar com ela. 

Esta manhã li na wikipedia o relato da vida deste homem que regeu o Brasil a partir dos seus 5 anos de idade quando seu pai parte para Portugal, para defender os direitos ao trono da sua linha, de que D. Maria sua filha seria a legítima herdeira, na sequência da sua abdicação e tentativa de acordo com D. Miguel. 

A vida de D. Pedro II é uma lição.  Um tipo notável, um dos mais ilustres Braganças. Falava uma série de línguas, correspondia-se com cientistas e filósofos. Modernizou e prestigiou o Brasil. 

Acordava diariamente às 7h00 da manhã e deitava-se às 2h00. Mas não deixa de ser também uma história triste. Um golpe de estado derruba-o. Não luta para recuperar o seu lugar. Herdou o trono, dedicou-se ao seu Império com a máxima das suas energias e capacidades. Faz lembrar um pouco também o nosso D. Carlos.

Em resumo:

D. Pedro II herda o Brasil, é um extraordinário estadista mas é deposto (os ventos da história são inexoráveis). 

Casa-se por mera conveniência. 

Derrubam-no. Ele que é um monarca exemplar. Morre pobre na Europa, parecendo nada reclamar para si próprio.

E assim pergunto: onde está a parte em que D. Pedro II é actor da sua própria história? É um homem tomado pelo peso do dever, muito nos antípodas do homem moderno, que se molda a si próprio, com liberdade. "Yo soy yo y mis circunstancias", dizia Ortega y Gasset. 

Enternece a vida deste homem, de D. Pedro II, que se deu, que pouco terá exigido para si próprio. 

No entanto, talvez tivesse sido mais interessante que ele próprio se tivesse imposto às circunstâncias. Não podemos apenas ser "pacientes" da nossa circunstância. Por isso é interessante certos homens que têm a coragem de romper com o que se espera deles. Um exemplo foi o que se passou com Eduardo VIII de Inglaterra que abdica do trono, talvez apenas um irresponsável que gostava de festas e de que Harry será um sucedâneo recente, um simpático e afável jovem.

Mas serve isto para dizer que há homens que conseguem perceber que o seu lugar na história abre-se à novidade e que há necessidade de rupturas. De jogar tudo e tudo ganhar ou perder. D. Juan de Bourbon, hoje caído em desgraça foi um homem assim. Ou homens como Lincoln, como Gandhi, que tinham uma bússola interior que ultrapassava as convenções. 

Há homens que, independentemente da sua ética exemplar não percebem a mudança que a história pede. A Primavera Marcelista, a Primavera Árabe foram exemplos de que uma andorinha só não faz a Primavera. Na política é preciso ganhar também. Não bastam as boas intenções. E é importante perceber que se pode também perder e não apenas gerir status quo. 

Salazar era um hábil político, um manobrador. Mas para mim, prefiro quem é também capaz de perder.

Ou seria o abandono de D. Pedro II, o seu aparente "baixar de traços" tributário da ideia de que mais do que tudo ele era apenas um homem? E que apesar de tudo, os últimos anos da sua vida seriam para ser apenas um homem que manteve a sua dignidade e de se entregar nos braços do Senhor?

Seria D. Pedro II a andorinha e o príncipe de Oscar Wilde que ele relata no seu conto "o Príncipe Feliz?" Um homem que pôs o serviço ao seu país antes de tudo? - Se for isso, devemos-lhe uma vénia de respeito.



  

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