Os distritos e a regionalização

Numa conversa ontem com José Ribeiro e Castro, sem fazer a mínima ideia que o próprio se tinha manifestado publicamente da mesma maneira, disse-lhe que o que fazia sentido para uma boa gestão do nosso território seria a figura dos distritos. No ano passado escrevi isso mesmo num livro que publiquei e que em poucos traços referia que essa seria a melhor lógica de compatibilidade entre a representação nacional (círculos por distritos) e a representação local, permitindo um verdadeiro escrutínio. Pensara eu que tinha sido uma pena ter-se acabado com a figura dos Governos Civis, pois eles permitiam uma lógica de representatividade do Estado a nível dos principais pólos de desenvolvimento do país, que são, naturalmente, as 18 capitais de distrito de Portugal Continental. Na minha ideia, é a administração local que deveria ser renovada, com a criação de municípios de peso mais relevante, isto é, conferir à figura das capitais de distrito um relevo também a nível de administração autárquica.

Penso que há aqui um enorme potencial e que as Regiões, como muito bem me dizia Ribeiro e Castro, desvia a atenção do que é importante. Vale a pena ler o seu artigo de 2019: https://www.publico.pt/2019/08/14/politica/opiniao/regioes-olhar-nao-1883150

Já eu tinha também pensado que não fazia sentido que todas as CCDR (futuro embrião das Regiões Administrativas) estivessem no Litoral, a não ser a cidade de Évora. Embora goste da cidade de Coimbra e tenha boas recordações de ter lá estudado, não posso deixar de achar que a CCDR-Centro estar lá localizada se deve ao peso político que continua a ter esta cidade, apesar de o seu peso económico e social ser cada vez mais diminuto. Viseu não tem o seu peso político, mas é uma cidade com um maior dinamismo por exemplo.

Ribeiro e Castro corroborou muitas das minhas ideias, o que me fez ver que não será assim tão estapafúrdio como isso o que defendi – pensando ser uma voz isolada.

Ontem ter-se-á reinaugurado na Praça do Império em Belém, lá estão os distritos portugueses gravados agora em pedra... A fotografia em cima retrata justamente um desses brasões dum distrito pelo que o assunto não deixa de ter actualidade... eu diria toda a actualidade como se verá já de seguida.

É porque, no que diz respeito a pensar-se o território, o nosso pensamento e acção estão espartilhados por muitas entidades, de vários âmbitos, desconexos e "deslaçados". Os municípios, as CCDR que foram criadas numa lógica de serem os embriões das regiões administrativas (que nunca chegaram a ser feitas, mas que não têm uma base sociológica real) e também as delegações distritais, poder desconcentrado do Estado, de turismo, de agricultura e outras mais, que se situam nas respectivas capitais de cada distrito (e que têm um passado que criou muitas raízes). 

Entre os municípios, as CCDR (pensadas para serem o embrião para as regiões administrativas e que são mais um nível de poder) e as delegações distritais do Estado, temos uma complexidade um tanto ou quanto desnecessária: muitos planos, mas sobretudo muita burocracia. Não há efectivamente centros de pensamento integrado e estratégico que pensem o território de forma coerente e sujeitas a escrutínio pelas populações. Creio que seria importante haver melhor articulação entre o Estado e as autarquias locais, instâncias que, embora de âmbitos diferenciados, devem coexistir nas escalas diferenciadas que têm, sem que haja sobreposições. 

Ora, os distritos têm uma real representação sociológica e quando votamos para a Assembleia da República, elegemos os nossos Deputados por distritos - pelo que há escrutínio directo pelos nossos representantes a nível estadual, que assim realizam uma importante função de soberania num estado democrático.  A ideia que defendi no meu livro é que nestas capitais de distrito e em todos os municípios - que não capitais de distritos, que tivessem uma população que ascendesse a um determinado número de habitantes, poderiam criar-se “autarquias de primeira ordem” com capacitação técnica para desenvolver planos de ordenamento para todo o seu território e ter uma série de atribuições, designadamente as actividades licenciadoras no domínio urbanístico. Aí, nessa lógica mais ampla, em que os distritos funcionariam como verdadeiros motores do desenvolvimento, com escrutínio tanto à escala local (como autarquias locais), como à escala nacional (Assembleia da República), se pensaria também como aproveitar da melhor forma possível os recursos.

Simultaneamente, apenas nas capitais de distrito, poder-se-ia criar um balcão único com todos os serviços desconcentrados do Estado, coordenados por um director com funções de gestão do Estado, desde a agricultura, áreas protegidas, turismo, saúde, educação, cultura, protecção civil, etc.

Por sua vez, os “municípios de segunda ordem” passariam a ter uma função essencialmente executiva e administrativa de proximidade às populações e com as antigas freguesias a serem seus serviços descentralizados. 

Somos chamados a interpretar a realidade aos olhos de hoje, no diferente contexto dos nossos dias. E ela não é a mesma do Portugal medieval, das autarquias que Alexandre Herculano postulou como a base administrativa do nosso país (e que são, sem dúvida). As distâncias encurtaram-se, a forma de utilização da terra alterou-se por completo, assim como a distribuição da população por sectores de actividade.

Na discussão da regionalização, que poderá estar para breve, faria sentido que se conseguisse defender a ideia de que faria todo o sentido impulsionar esta ideia dos distritos (com a modelação particular que mais fizesse sentido, mas com ousadia). 

Esta ideia dos distritos não é uma ideia de direita nem de esquerda, aliás parece que um dos melhores planos terá sido do PCP há alguns anos, segundo o mesmo Ribeiro e Castro. 

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