A Nova, os novos... e a pedrada no charco da velha/nova Gulbenkian!

Ontem à noite, no meio da agitação, que passou a regra ao nos movimentarmos no Chiado - acotovelando-nos a uma turba de gente de todo o mundo e onde escasseiam os de cá,  passou por mim um grupo de caloiros envergando t-shirts com a inscrição "Nova School of Law", designação que terá sido proibida pela Ministra, na sequência duma queixa por violação do artigo 10 n.º 1, do Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior. Segundo consta, esta norma prescreve que as instituições de ensino superior devem ter denominação própria e característica, em língua portuguesa, que as identifique, de forma inequívoca, sem prejuízo da utilização conjunta de versões de denominação em línguas estrangeiras. 

Tal situação é sinal dos tempos confusos em que vivemos, que nos fazem questionar o que é do núcleo da identidade, tendo presente a já mais do que normal livre circulação de estudantes na licenciatura (fruto certamente do sucesso do Programa Erasmus), aliada à necessária atractividade de estudantes internacionais para programas de pós-graduação e mestrados (onde o marketing joga certamente a sua parte e, tantas vezes também, a sustentabilidade financeira e o prestígio das faculdades).  

Mas mais do que discutir a questão do nome (que um qualquer bom professor da Nova School of Law conseguiria afinar juridicamente, bastando que permanecesse a versão em língua portuguesa nos Estatutos, e que se pudesse utilizar tipo "marca" uma versão no inglês, a língua franca dos nossos dias), o que está neste momento mais em cima da mesa é, justamente, a pergunta sobre que oportunidades o nosso país oferece aos jovens, à gente nova: na verdade, ao ver aqueles cerca de 50 estudantes a saltar e a cantar, naquele grupo que pouco se dissocia de tantos outros grupos de caloiros pela cidade, sobreveio-me um arrepio frio na noite quente - um arrepio pelo seu futuro. Será que o seu entusiasmo é autêntico porque o que planeiam é, uma vez acabada a licenciatura, "zarpar" para outros rumos? Um bye-bye Portugal?! Ou o seu entusiasmo é o de quem não sabe ainda o que os espera?! Inclino-me talvez mais para esta segunda opção, porque o direito é daquelas áreas em que é mais difícil Portugal exportar (cada país tem o seu sistema jurídico próprio). 

Sebastião Bugalho, no Expresso, num artigo de dias intitulado "Exportar o Futuro", fala-nos destes problemas e parece que se terá também tornado viral um tiktok dum jovem que, perplexo e com razão, compara o  "John" e o "João", sendo o primeiro estrangeiro e o segundo português, sendo que John ganha 5 vezes mais que o João, mas ambos pagam a mesma taxa de IRS, ou seja temos uma política de atracção de investimento, mas não temos uma política de retenção de talento.

Em Portugal, os jovens não contam porque, além da idade ser sinal de estatuto, o que os governos têm feito é manter satisfeitos quem já está no sistema. Assim se condena o entusiasmo da juventude a fenecer, porque não há política de juventude, que não importa porque não é relevante eleitoralmente, num país cada vez mais velho. Por outro lado, os jovens por cá são considerados como imberbes: "vê lá se cresces e apareces". Lembro-me de Adriano Moreira dizer que certo dia o acusaram de ser muito novo, ao que ele respondeu "não se preocupe, isso passa com a idade..." No nosso país ainda se acha jovem uma pessoa com 50 anos; um Presidente da República seria considerado jovem com essa idade. Na Europa porém temos vários exemplos de primeiros-ministros ou presidentes na casa dos 30 (veja-se o caso da Finlândia, da França, ou recentemente da Aústria).

Por força do 25 de Abril e da mudança dum regime para outro, muitos dos que vieram a "governar" o país estavam na casa dos 30, quando acederam a posições de decisão e poder no aparelho de Estado, nas autarquias e nos partidos. Ou seja, eram novos. Isso foi a excepção porque em geral o nosso país, culturalmente -  o que vem já de longe -, não premeia a inovação, é excessivamente conservador, para não dizer paternalista. Denota-se esse fenómeno em quase todas as instituições, a começar pela Administração Pública, onde aliás a média de idades é elevadíssima. Este aceitar do status quo e o medo de ser diferente fazem com que haja uma acomodação imobilizante: "Chefe é chefe, e merece todo o respeito - mesmo quando mete o pé na poça"; "O Dr. é Dr. e eu apenas um mero funcionário, o que seria se chamasse a atenção dele para alguma coisa?..."; "Respeito e respeitinho, que eu sou o teu chefe".

Mesmo o sistema de acesso ao capital, que permite ter meios para se tentar a sua sorte, e que as mais das vezes acontece só quando se herda, faz com que cada vez mais tarde (devido à maior esperança média de vida) se possa investir e ser livre para os planos tantas vezes adiados.

Não premiamos o novo e os novos. Comecei este texto com a Nova, que tenta ser nova, mas que forçam a envelhecer...

Vai daí que esta semana fiquei surpreendido com uma iniciativa exemplar e a contra-corrente, verdadeiramente uma "pedrada no charco". A Gulbenkian, sendo já velha, acabou de dar um exemplo de que é nova! Ora leia-se:

Na primavera de 2024, o CAM – Centro de Arte Moderna Gulbenkian reabrirá as portas do seu edifício ao público com uma nova visão: libertar o poder transformador da arte para gerar mudanças pessoais e sociais. Uma das prioridades é ampliar e aprofundar a relação do CAM com os públicos, em particular os mais jovens. 

Para isso, irá criar um Conselho Consultivo Jovem, constituído por um grupo diverso de nove pessoas, que terá a possibilidade de conhecer e acompanhar o trabalho de profissionais nas áreas da programação, curadoria, coleção, divulgação e direção, bem como refletir sobre as necessidades das novas gerações e participar na ação e no desenho da programação do CAM. O primeiro Conselho Consultivo terá a duração de 10 meses (set 23–jun 24) e a participação será remunerada em 1000€ no fim do projeto.

Candidata-te até 19 de setembro!

"Chapeau" para a Gulbenkian!

 

 

 



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