Trabalhar para a saúde mental

"Depressão e Ansiedade", dá o título para uma TED talk de Johann Hari que estive ontem a ver. Será porventura um tema deprimente, para um dia já de si deprimente (Domingo à noite)...

No entanto, é algo de que tenho cada vez mais me interessado, no sentido de perceber o fenómeno, que é muitíssimo importante, pois os nossos estados de alma não se furtam a períodos mais negativos, que poderão ser longos - e nós nem deles nos apercebamos. Cuidar do nosso mundo interior tem sido para mim uma aventura de aprendizagem, que me fascina. Passar de estados de penumbra, para estados de alegria e luz.

Johann Hari ensaia falar sobre o tema e parte de duas constatações: há cada vez mais pessoas deprimidas e ansiosas no mundo; por outro lado, ele próprio teve períodos de depressão e a forma como os médicos a trataram fê-lo pensar; segundo as práticas comuns seria um problema biológico, de desequilíbrio químico do cérebro; a solução passaria por combater a falta de serotonina. Parece-me um assunto de enorme relevância e que deveria motivar estudos científicos, pois devemos conhecer muitos casos em que assistimos a problemas de saúde mental, nomeadamente de idosos que estão deprimidos - e a solução por vezes empregue é a de dar remédios, por se pensar que terão uma qualquer insuficiência de produção química no cérebro. Ora, tendo viajado cerca de 40.000 km e conversado com especialistas de todo o mundo, Johann Hari apercebe-se que as causas da depressão são múltiplas e variadas, sendo que apenas uma ínfima parte delas se baseia em razões biológicas - embora o tratamento passe na maior parte dos casos pela prescrição de químicos, "abafando" a raiz do problema. 

As conclusões de Hari não são surpreendentes, embora não estejamos tão alertas como isso: a depressão é potenciada pelo isolamento e a solidão (não acontece com tantos idosos?), o que nas nossas cidades, na correria em que vivemos, acaba por ser um dado frequente. 

O que diferencia a nossa sociedade actualmente das comunidades ancestrais é que muitas das nossas necessidades psicológicas não são preenchidas: todos temos necessidade de pertencer a algo (em inglês, um termo que gosto que é "to belong"), de termos capacidade de controlar em certa medida as nossas vidas e de nos projectarmos no futuro. A falta de sentido comunitário é um dos principais problemas: há muita gente sem ninguém para conversar.

Na verdade, acaba por ser muito daquilo que eu pensei quando fiz aquele trabalho sobre o "clima" de locais como as escolas: os ambientes onde nos movemos são essenciais para o nosso equilíbrio/desequilíbrio interior. Lembro-me de estudar um autor que é Lickert e que fala em "ambientes abertos" e "ambientes fechados": vivemos melhor em ambientes abertos, em que podemos ter graus de autonomia, com responsabilidade. Por isso, não sou nada partidário de ambientes de trabalho onde os chefes são controladores e andam sempre em cima dos empregados. Hari dá-me razão e fala num exemplo em que determinadas pessoas que tinham um certo trabalho resolvem despedir-se dessa empresa onde tinham um chefe déspota, para montar um negócio com um grau grande de autonomia: o trabalho era exactamente o mesmo, mas a forma como faziam o trabalho era muitíssimo diferente (não havia uma hierarquia, trabalhavam de forma autónoma e decidiam as coisas em diálogo).

Acredito que na profissão que exerço, a advocacia, se encontram ambientes muito corrosivos para o ser humano. Eu próprio já vivi em locais onde o lado humano falha. Na verdade, parece que há uma certa cultura desumana na profissão que nasce na própria universidade e dum fascínio pelas "mentes brilhantes": aqueles professores excessivamente exigentes que chumbam os alunos, não se dando sequer ao trabalho de os tentar conhecer; ou aqueles profissionais que são tão inteligentes (serão do ponto de vista emocional?) que tratam todos os outros (sobretudo quem está na sua dependência) como umas "bestas". Hari dá um exemplo que choca, sobre como está o nosso mundo. Perguntada sobre se teria casado com Donald Trump se ele fosse pobre, Melania Trump responde com outra pergunta: teria ele casado com ela se ela não fosse bonita?! Isto significa que eu sou na medida em que agrado ao outro. Não amo o outro por alguma qualidade que vejo nele, apenas pelo que é acidental e passageiro. Ora isso cria um sentimento de insegurança enorme. As pessoas usam-se e depois deitam-se fora. Por isso custa ver que tantas pessoas se empregam num determinado sítio, como estagiários por exemplo e que terão que fazer muitos "números" para agradar, porque no fim do estágio só ficam 2 ou 3. 

O livro de Frederico Pery que tenho estado a escrever tenta aprofundar isto.

Actualmente exerço a minha profissão num local onde trabalham muitos outros colegas e há um espaço de diálogo interessante, sem medos.

Uma das principais mensagens de Hari é que a depressão, mais do que ser inundada por químicos para a neutralizar, precisa de ser compreendida como um sinal, de que algo precisa de ser reflectido na vida de determinada pessoa. De facto, uma das mensagens que mais me interessou nessa comunicação foi a de que devemos tentar encontrar motivações internas, mais do que motivações externas. As motivações internas são razões que vêm de dentro para fazermos determinada coisa: gosto de tocar piano porque isso me dá prazer, por exemplo; motivações externas são quando toco piano porque, embora nem me dê tanto prazer, preciso de trazer um ordenado para casa e por isso tenho que ir tocar a um bar.



  


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