Os valores


Qualquer profissão tem que ter por referência um bem.  Um médico ou um enfermeiro põem o seu saber ao serviço do cuidado dos seus doentes, mas um engenheiro ou um electricista não deixam de realizar o seu trabalho à luz de algo que de certa maneira os transcende.
Na verdade, há um quê de dádiva em cada profissão, remetendo para a Parábola dos Talentos em que eu ponho os meus talentos a render, em vez de os enterrar na terra.
O desenvolvimento dos nossos talentos é feito na caixa de ressonâncias interior, de mim para mim, mas em que convoco para esta conversa os ecos do exterior, aquilo que apreendi do mundo e que o mundo desperta em mim de atitudes, de esforço, de vontades afinal.
Ontem jogava ténis com um amigo meu. Dei-me conta que o que o mundo nos transmite é muitas vezes que temos que ganhar, ser os melhores, introduzindo-nos numa lógica de ganhadores/perdedores. O desporto ensina-nos a querer ganhar - o que me parece que é sem dúvida nenhuma bom, mas devemos saber trabalhar em conjunto e ambientes muito competitivos podem destruir a lógica colaborativa que é essencial para o progresso da sociedade.
Uma verdade evidente é que a realidade é dura, cheia de combates e a resiliência é uma característica fundamental. A palavra "paciência" tem a mesma origem etimológica de "paixão", de dor e significa algo como "aguentar o sofrimento".
Sem dúvida que na vida os nossos combates são muitas vezes combates solitários e temos que ser "pacientes" - descer aos vales escuros. Ai encontramos também convites ao desânimo e a fraquejarmos.
Mas a resiliência faz-se muito também de vontade de sacudir o pó e andar para a frente. Nisso o desporto é exemplar. 
Gandhi sabia viver no combate, na dificuldade, no suspense. A sua vida ensina-nos que quando temos um ideal, as dificuldades podem-nos momentaneamente toldar a visão, mas pouco a pouco vão-nos fortalecendo: "o que não mata engorda". Ou como dizia Lincoln: "quando fazes um mau negócio, dedica-te mais ainda a ele". O desânimo deve apenas ser temporário, temos que procurar estratégias para melhorar as nossas condições. Muitas vezes o maior consolo é a nossa paz interior.
Qualquer profissional deve encontrar as razões pelas quais acorda todos os dias para novos esforços. Em última instância cada um realiza-se dando um pouco de si ao mundo. Por isso, todas as profissões têm algo de político, de se dar à sociedade. De acrescentar valor. Devemos pensar em que medida a nossa profissão é uma forma de acrescentar valor e sermos os tais desportistas que nunca desistem e que querem dar o melhor de si e que sabem que as vitórias dependem normalmente de muitas vontades congregadas e do trabalho de equipa.




 

Comentários

Monserrate disse…
"Todos nós fomos criados para ser deuses, não no sentido de sermos perfeitos ou virtuosos, mas no sentido de atingirmos o máximo de que somos capazes, de visarmos a plenitude do nosso ser, na integridade, na capacidade de realização e no entusiasmo.” (Maria Ulrich)

Quantas vezes reconhecemos e alimentamos este nosso lado divino? Em quantas renovamos e fazemos render os dons que nos foram dados?

Vivemos tempos que desvirtuam esta nossa essência humana… a de nos entregarmos a cada dia ao serviço dos outros… sem nos deixarmos corromper pelas nossas ambições, valorizações, destaques, promoções, recompensas, estatutos, lugares. Sempre acreditei nesta entrega, na nossa vocação… no acordarmos todas as manhãs na certeza que fazemos aquilo para que fomos “talhados”. Que só isso nos dará a felicidade e paz que precisamos. Há uma frase que me diz muito e que toca isto “Semeia-te como és e oferece-te simplesmente à colheita de todas as horas;”

É tentador olharmos e desejarmos caminhos que não serão os nossos, que não nos são pedidos… mas com um coração centrado no essencial facilmente saberemos escolher, aceitar e rejeitar. Sem nada temer! Dizem que sou pouco ambiciosa, que arrisco pouco, que não agarro oportunidades… talvez porque quando estamos no caminho certo, pouco mais desejamos…. há certezas grandes no coração. Nunca tive medo de as viver… Mesmo que me queiram em outros lugares, em outros "papeis", é este que escolho e onde quero estar. Tenho a sorte de fazer aquilo que gosto.

Quantas fezes avaliamos o nosso percurso profissional? Quantas vezes o consagramos no nosso coração?

Porque tantos falam do peso, desmotivação, da pressão e infelicidade no trabalho? O que leva a isto? Empresas menos humanizadas? Reflexo da escravatura dos tempos modernos?

Gosto do exemplo do desporto, da nossa capacidade de resistência/resiliência que devemos despertar/trabalhar desde os primeiros anos de vida. Como nos relacionamos com o “não” com as frustrações? Que respostas positivas e proativas damos à vida? Desenvolvemos esta capacidade em nós? E nos outros?

Mais do que ganhar ou perder defendo a ideia da excelência… de fazermos sempre o nosso melhor, o máximo de que somos capazes… mesmo que o nosso melhor não seja o pódio. Acredito que só assim haverá reconhecimento e paz nos resultados alcançados. Procuramos e valorizamos a excelência nos outros?

"Em que medida a nossa profissão é uma forma de acrescentar valor e sermos os tais desportistas que nunca desistem e que querem dar o melhor de si e que sabem que as vitórias dependem normalmente de muitas vontades congregadas e do trabalho de equipa."

Que valor é este?

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