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Por Londres

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Estive uns dias por Londres recentemente. O fito principal desta viagem era fazer algumas pesquisas para o livro que tenho andado a escrever, uma pequena obra de ficção, que tem o seu início justamente em Londres. O livro começa com um percurso pelo St James Park, rumo à National Gallery. Aí, um cortador-de-relva remete a personagem principal do livro para a sua infância na Serra da Arrábida, onde um conjunto de miúdos se deitavam à volta duma piscina, num relvado. Ora os meus dias por esta cidade começaram justamente pela National Gallery, local onde haverá uma conversa frente a um intrigante quadro de Hans Holbein, os "Embaixadores". Surpreendido por ser gratuita a entrada no museu, lá me desloquei até ao famoso quadro e assisti a explicações sobre o quadro e aprendi novos ângulos sobre os quais o quadro pode ser analisado. O problema da consciência, da escolha entre o bem e o mal, por exemplo. O tema central do quadro é o cisma que Henrique VIII cria em relação à Igreja Ca...

Tia Maria José, nos seus 80 anos

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Temos uma família alargada numerosa. A tia Maria José, casada com o tio Thomaz, o irmão mais velho dos filhos da avó Mi e do avô Augusto e meu padrinho é um elemento muitíssimo importante e de quem todos gostam imenso. Faz parte da nossa vida, habituámo-nos a contar com a sua presença desde novos e posso dizer que ela sempre acrescentou. É uma pessoa muito completa. Muito atenta aos outros, exerce como poucos a capacidade de escutar e interessa-se genuinamente pela vida das outras pessoas. É essa uma das qualidades que mais admiro na tia Maria José. Quando estamos há mais tempo sem nos vermos e nos encontramos, tenta saber de nós - e sentimos que não se trata apenas de perguntas de circunstância. Certas vezes, tenho tido a sorte de ir jantar a casa dos tios a Santa Isabel, onde a tia promove jantares com sobrinhos, nomeadamente aqueles (muitos) afilhados dos tios. É uma pessoa que reúne os outros à sua volta, que sabe unir. Não conheço ninguém que não goste dela. Tem sempre uma palavra...

A esperança demencial de dois argentinos

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Não estamos autorizados a dar-lhe essa informação

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Joseph K. foi certamente vítima de alguma calúnia, pois, numa bela manhã, sem ter feito nada de mal, foi detido. (...) No mesmo momento, alguém bateu à porta e um homem que ele nunca antes vira naquela casa entrou no seu quarto. (...) Não - o Senhor não pode sair, o Senhor está preso. É o que parece - observou K. - E porquê, pode-se saber? - Perguntou ainda. - Não estamos autorizados a dar-lhe essa informação. Vá para o seu quarto e aguarde. Foi-lhe instaurado um processo e, no momento próprio, será informado do resto. K. pouco se importou com aquele conselho, o que o preocupava realmente não era o direito que talvez ainda possuísse de dispor sobre as suas coisas, mas sim conseguir perceber o que se passava naquela casa. in, "O Processo", de Franz Kafka

A janela para deixar entrar a brisa

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Podemos naturalmente dizer que do lado da leveza está a alegria. A alegria é leve, voa como um pássaro feliz.  Voltei hoje a umas leituras sobre Maritain: por alguma razão atrai-me pensar nele, ele que restaurou S. Tomás de Aquino e, por este, também Aristóteles.   Num livro que sentado no sofá da Bertrand fui lendo ao bocados nos seus primeiros capítulos, George Weigel diz-nos que quando o Papa João XXIII resolveu convocar a Igreja para o Concílio, pediu que os Bispos se pronunciassem sobre o que seria relevante discutir. Parece também que foi quando uma janela se abriu, ao fazer a barba, que o Papa teve a iluminação de convocar essa magna reunião, para que a Igreja deixasse entrar o ar fresco do espírito, tal como a brisa do ar que entrava pela sua janela. O Espírito Santo é um pássaro alegre que voa, livre. É um pássaro colorido e veloz. Não o devemos aprisionar em fórmulas, pretendê-lo fechar em caixas, numa qualquer gaiola.  Em resposta ao convite do Papa, Karol...

Mundo da pós-verdade

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Ontem, numa peça jurídica, escrevia que uma mentira repetida muitas vezes se torna entretanto verdade. Vinha hoje a pensar no caminho para o escritório na amoralidade dum homem como Donald Trump: o que interessa é ser-se vencedor, preside a lei do mais forte. A América que era uma terra onde classicamente se distinguia o bem do mal, é agora uma terra da relatividade dos valores, onde cada um tem "a sua verdade".  A invasão ao Capitólio, incentivada por ele, foi um atentado gravíssimo (talvez o mais grave de que há memória desde a guerra civil) às instituições americanas. Os processos de inquéritos demonstraram à saciedade a sua passividade naquele dia 6 de Janeiro de 2021, em que aquela mole humana convocada por ele para se manifestar contra os resultados das eleições, se dirigiu ao Congresso. O poder tremeu e podia ter sido um banho de sangue. Como uma das primeiras medidas após a sua tomada de posse há dias, resolve libertar os "reféns" presos... Como chegámos aqu...

Será conservador ou conversador?!

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Sentados os dois para discutir sobre a orientação do novo livro, Zé diz-lhe: " tu és conservador e as ideias e livros dos conservadores infelizmente pouco vendem ". Estamos habituados a que a esquerda acuse a direita de ser estúpida. Como se fosse a direita coincidisse com o estado de privilégio do nascimento - e a esquerda tivesse o privilégio de dizer o que deve morrer e ser enterrado, por disposição natural. Há direita estúpida e há muita esquerda estúpida, facciosa, preconceituosa. O império da estupidez estende-se por territórios extensos e não encontra fronteiras.  É pena, porque a experiência humana não é para ninguém um caminho rectilíneo, também há muitos caminhos difíceis. Há uma ontologia da vida que é do Ser Humano - a comunicação mais do que servir para ser distribuída à direita ou à esquerda, destina-se à partilha com outros seres humanos e à necessidade de nos abrirmos a alguém semelhante. Quando somos capazes de despir-nos de todos os rótulos e adentrar-nos, p...

O Mário e a Maria

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Tenho um amigo sábio de mais de 80 anos (o Mário) que diz que há certas pessoas que não conseguem viver sem escrever. Creio que era Agustina Bessa-Luís que também o dizia - confessava que era algo tópico, epidérmico: quando não escrevia sentia-se privada, privada de uma substância química essencial para o seu equilíbrio homeostásico. Tenho uma amiga, a Maria (bem mais jovem que os 80 anos) que também escreve e que lê muito (além de outras coisas mais interessantes, lia o meu blog). Não sei como se sente, se também é como eu, que precisa da escrita, como de um "comprimido" para o bom-humor.  Vejo a escrita como um "ruminar" que mastiga o mundo, o "meu" mundo. É uma actividade solitária, para lobos. Lobo Antunes será um desses lobos pois, tendo o ofício de escritor, considerou que para a ele se dedicar tem-se que se ser lobo. O nome Lobo não lhe fica mal então. Senti-me privado quase durante um ano desta escrita por aqui. Tenho-me dedicado a um outro project...