Portugal a ficar para trás?

Num muito claro e bem escrito ensaio publicado na edição saída este mês de Março na Revista Brotéria, o Prof. João César das Neves discorre sobre o nosso país e por que razão vamos ficando para trás em relação a outros países que entraram depois de nós na União Europeia. Sem simplismos e tendo noção de que não se explicam causas complexas com apenas uma ideia, João César das Neves desenvolve porém a sua opinião considerando que a razão que explica esse ficar para trás é essencialmente uma questão de falta de ambição.

Assisti a uma conversa na semana passada, justamente na própria Brotéria, em que se apresentou este artigo e, de facto, acho que é um artigo certeiro em muitos aspectos. Toca também na extrema descapitalização do país, que não permite senão conceder baixos salários e que também aos empresários deixa pouco espaço para investirem, o que acaba por fazer-nos pensar que não nos temos sabido bem governar porque fomos vendendo os anéis todos e, agora, só nos restam os dedos (mas que também houve quem se "soube bem governar"...). Defende também que a questão do Euro é um mito pois países houve que conseguiram crescer e neste aspecto não sei se concordo inteiramente com ele.

Mas o ponto é essencialmente a questão de atitude. É satisfazermo-nos com o "quentinho". 

Na conversa que tivemos na semana passada na Brotéria dizia João César das Neves, "bom, somos um país rico". E dizia que se nos compararmos com a maioria dos países desse mundo, estamos sem dúvida nenhuma entre os países mais ricos do mundo. Diz-nos César das Neves que essa de ficar no "quentinho" é uma tendência muito antiga: foram as especiarias das Índias, foi o ouro do Brasil, são as "bazucas" europeias. 

Tenho eu para mim que me custa muito aceitar a mediocridade, a tal que permite que os medianos encontrem sempre o seu caminho, enquanto que aqueles que talvez pudessem representar a diferença são acusados de "estragarem o ambiente". Esta mediania, que me parece em bom rigor  "mediocridade", é algo muito castrador e, em certo sentido diria também que constitui uma ditadura conformista e incomodativa. Belmiro de Azevedo dizia, contra um Estado que dificultava a livre iniciativa - e que no caso dele, como se viu, manifestamente o prejudicou pois ele não compactou com Sócrates - que já era "bom que não atrapalhasse". 

Confesso que não sei qual a melhor estratégia, se será não aceitar a mediania e lutar contra ela frontalmente, ou a de "jogarmos" o jogo político das meias palavras e das mensagens subliminares, mas pretendermos elevar o patamar. Mas isto tem os seus perigos também. Devemos ser desconfortáveis, ou confortáveis e em certo sentido "manhosos" e, com persistência, levarmos a água ao nosso moinho? - "bons como as pombas e prudentes como as serpentes"?

Dei também por mim a pensar nos últimos dias na sabedoria de Lincoln: conta-se que certo dia disseram-lhe que certo tipo que ele tinha como ministro, ou algo assim, era perigoso porque era muito ambicioso. Ao que ele respondeu com uma das suas míticas histórias: "havia um cavalo velho que arava um terreno, que era muito lento, mas certo dia esse cavalo fez o trabalho que fazia numa semana porque umas mosca que o ia picando não o largou o tempo todo. Deixem lá a mosca, que ela ao menos não deixa o cavalo adormecer!"

Como espicaçar cavalos velhos? Com vareta? Com cenoura à frente do nariz? 

Normalmente, prefiro atacar de frente. Gosto da expressão do "direito à indignação". Esse direito à indignação não tolera esquemas e ditaduras e é mais transparente.

Claramente que falta muitas vezes ambição a Portugal. Porque desapareceram de cena homens como Sá Carneiro, um homem que era exigente e empenhado?! Só quase que vemos homens habilidosos que não têm a coragem de ser desconfortáveis. E cedemos demasiadamente a quem não quer levantar ondas, quem quer "safar a pele".


 

 


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