Estudantes de direito e saúde mental



"Os estudantes de direito começam a faculdade de direito com um nível alto de satisfação com a sua vida e recursos mentais fortes. Mas no primeiro ano de faculdade, eles experimentam um aumento significativo de ansiedade e depressão. As pesquisas sugerem que os estudantes de direito estão entre aqueles mais insatisfeitos, desmoralizados e deprimidos de quaisquer  estudantes universitários" (A. A. Patthoff, in "This is your Brain on Law School: The Impact of Fear-Based Narratives on Law Students", 2015 UTAH L. REV, 391, 421 [2015]

Isto poderia quase ser o relato da minha experiência. Ao entrar na faculdade ia com os níveis de confiança em mim bastante altos: muito bom aluno no secundário, cheio de vontade de dar o meu melhor e de vingar.

A praxe foi logo um embate com uma realidade que se escrevia de uma forma diferente daquela a que estava habituado. Não é que me tivesse marcado especialmente como algo muito negativo, mas dava a nota para um ambiente um tanto ou quanto hostil. 

Uma enorme turma de 250 alunos. Quase ninguém se conhecia e ali estávamos para caminharmos ao longo de 5 anos de estudos.

Tive alguns amigos no 1.º ano, mas essas amizades foram-se desfazendo e a verdade é que no 2.º ano a minha desmotivação era grande. Senti-me muito só. Tive uma cadeira que foi Direito Administrativo, um enorme cadeirão em que era preciso decorar muito; outra, Teoria Geral do Direito que era estudada a partir dum manual que creio era de José Oliveira Ascensão e que era um quebra-cabeças, de uma leitura bastante difícil e de lógica um tanto ou quanto tortuosa. Havia ali desafios intelectuais difíceis e eu não tinha ali recursos metodológicos para me saber orientar. Faltava naturalmente um corpo de professores que tivesse dimensão pedagógica.

Nos corredores da faculdades uma grande percentagem dos alunos fumava, o que era indicador que altos níveis de stress eram sentidos por todos. Um curso de direito é difícil, ninguém o pode negar.  

Sentia-me só e imbuído num ambiente que em certa medida não premiava muito a dimensão humana das pessoas e o que elas eram, notando-se também em larga medida a falta de solidariedade das pessoas e uma certa competição, havendo uma cultura de que as notas que se tinha falavam da dimensão da pessoa. Nessa desmotivação que senti, era natural que fizesse um desinvestimento. O que fiz na verdade, acabando por me envolver em muitas actividades diferentes, o que teve por efeito uma dispersão e um mais do que evidente fraquejar. É claro que as notas se ressentiram, assim como naturalmente a minha auto-estima. Creio que terei vivido em depressão alguns anos, isolei-me muito, costumava andar pelo Carrefour que era por perto onde por vezes ia almoçar, para fugir da universidade e de ter que fazer conversa. 

Devíamos em geral estar mais atentos ao período da universidade, ele pode ser muito duro para muita gente. Há quem sofra no silêncio, como aconteceu um pouco comigo.

Já falei com outras pessoas que também sofreram na universidade de depressão.

O tirocínio para fazer de nós juristas, compreende necessariamente muitos sacrifícios e disciplina. No entanto, há uma dimensão humana essencial que devemos sempre privilegiar. A mim choca-me, mesmo nas tropas de elite, que treinos possam levar pessoas à depressão. Das duas uma: ou aquilo não é para elas (e pode não ser); ou então, as coisas poderiam passar-se de outra maneira. E se calhar, na maior das vezes podem passar-se mesmo de outra maneira. Aliás não vejo como podemos ter futuros advogados ou juízes que não sejam pessoas equilibradas e sãs do ponto de vista psicológico. Não as ter é certamente um assunto que nos devia deixar preocupados.




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