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Memórias

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Naquele ribombar suave do mar, com a leveza tranquila de quem não tem pressa, uma família, unida pela alegria reconfortante da beleza do lugar e abençoada pelo relevo esverdeado e ritmado dos montes circundantes - de onde palram os grilos, conversa na tombadilha. O peixe inunda o espaço do fumo da grelha. Uma garrafa de branco dá-se em verso no copo de cada um, enquanto o barco balança ao som de Frank Sinatra . Tempo para mais um mergulho ainda! Enquanto dum só salto se lança, uma recordação antiga reacende-se: aquele assomo da criança que tentava chegar à superfície da água da piscina, rasgando com braços nervosos a massa de água pela sua frente; um pai e uma mãe, um de cada lado, com os seu braços abertos, na aposta que ele conseguia! Ao princípio é assim: a confiança que lhe tinham era também a sua! O orgulho em agradar aos seus pais, disso se faz muito o crescer duma criança. Um dia, dentro duma secretária de madeira, abrindo a tampa que se abria do alto, um cartão premiav...

Much ado about nothing

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Sempre acho que fui mais de ver as coisas pelo lado positivo, do que pelo lado negativo. Por vezes, em certos meios, assiste-se a teorias da conspiração tipo "eles são" isto ou aquilo. "É a maçonaria que esta por detrás" disto ou daquilo. São os "socialistas", são estes ou aqueles. "É o papão que aí vem" e que nos vai comer a todos. A política está cheia de parangonas e de proclamações. Faz-se facilmente generalizações, condena-se muito rapidamente. Quando se pretendeu dar o título "Cities under Pressure" ao evento que teremos em breve em Lisboa e em que discutiremos o mercado imobiliário, o acesso à Habitação e o Turismo, não gostei incialmente do mesmo. Pareceu-me um pouco exagerado.  Não alinho, nem um pouco no discurso do Bloco de Esquerda, desmascarado recentemente pela sua falsidade. Prefiro olhar para números, para dados estatísticos para retirar conclusões.Isto dá mais trabalho, mas naquilo que fazemos na Build the Ci...

Diferenças culturais

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Julgo que a riqueza da Europa se faz da sua diversidade. No outro dia comentava as palavras do meu amigo José Sarmento de Matos que me disse já por várias vezes que os portugueses são dentro da Europa os comunicadores por excelência. Vem-nos isso da nossa posição geográfica, como finisterra , local onde se fixaram povos porque não havia mais para onde ir: o grande oceano é um abismo difícil de suplantar; no entanto, em terra firme, um clima soalheiro e temperado e um ambiente simpático para se viver; na expressão da outra senhora, "um jardim à beira mar plantado". Dá preguiça sair de Portugal, é mais fácil ficar do que sair. Uma terra assim, não é um local de passagem, mas de fixação, de sedimentação.   Naturalmente que hoje, com os aviões, circulamos facilmente por todo o lado e que a nossa posição periférica se atenuou. Mas o substracto cultural dum povo que se habitou à diversidade e ao diálogo ficou-nos. É surpreendente o número de portugueses em posições de grande r...

Vida feliz no meio da tribulação

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Diz-nos o Pe. Tolentino no seu recente livro sobre as perguntas que alguns homens que viveram prisões e perseguições terríveis tiveram no meio da tribulação uma vida feliz porque algo maior prendia o seu coração. Podia ser a a visão de algo bonito, quer-me parecer que pode ser a ideia de uma grande utopia, um grande amor. Aquilo que nos prende o coração, dá-nos esperança e leva-nos a sermos fortes. Nesse sonho, tem que haver ternura e carinho para nos fazermos humanos, mesmo que isso nos faça vulneráveis. Sim, porque na vida tudo o que nos endurece e torna-nos "fora de nós" é sinal de fuga, de descentramento. O difícil é que "continuemos dentro" e que nos abramos ao mistério das coisas. Fazer-nos duros, impassíveis, é fecharmo-nos ao mundo. Mas termos a capacidade de nos comovermos e nos entusiasmarmos, isso sim! Ser forte não é ser duro, ser forte é apesar de tudo não perder a nossa candura e continuar para a frente. E reparar nas coisas bonitas que o caminho nos ...

Ser advogado

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O QUE É VERDADEIRAMENTE UM ADVOGADO? Um parceiro? Um amigo? Sempre gostei de pensar na relação advogado/cliente como uma relação de parceria. Segundo Fried, um professor americano, o advogado será alguém que guia o cliente no sistema legal: “as instituições sociais são tão complexas que sem a assistência de um consultor especialista, um leigo comum não pode exercer a autonomia a que tem direito dentro do sistema”. A função do advogado seria assim “preservar e incrementar a autonomia do cliente dentro da lei”, sendo que etimologicamente “advocatus” derivou da expressão latina "ad auxilium vocatus" (o chamado para auxiliar). Hoje sistema legal é tão complexo, difícil de enxergar e aplicar, que só alguém formado para o efeito tem ferramentas para se orientar nesse sistema. Com a produção legislativa abundante, o velho ideal liberal de que o cidadão deve conhecer a lei e que se plasma na máxima de que “a ignorância da lei não aproveita a ninguém”, resulta em algo hoj...

A força do hábito

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No fim-de-semana passado estive no Alentejo no monte dos meus pais. Pensei que iria estar uns dias no sossego, a preparar trabalhar num projecto que estou a desenvolver - no entanto, chateei-me que "nem um perú". O tempo estava mau, não havia muito a fazer.  Acho que desde que vim viver para Lisboa que me habituei a estar muito mais em actividade, a ter muito mais entretenimento. E daí que, embora por vezes pense que não me importaria de viver fora da cidade de Lisboa, tenha vindo com a sensação que sair de Lisboa me vai exigir uma grande capacidade de adaptação. De facto, por vezes penso que não me importaria de viver numa cidade mais pequena do que Lisboa. Contudo, ir viver para outro sítio obriga-nos a ter que repensar todo o nosso modo de viver e em fazer novas relações. Nada disso é fácil. Por isso, nunca poderá ser de ânimo leve que mudaremos. 

Dar vida

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A matéria no contacto com o ar tem tendência a se decompôr. A vida biológica, na sua minúscula dimensão, não descortinável a olho nu, está em permanente mutação. O ciclo da vida é a história da constante decomposição da matéria e o seu renascimento em novas formas. A vida é um pulsar dinâmico, um palpitar. Um balanço. Um frémito. A respiração, que alterna inspiração com expiração. Creio que tudo aquilo que nos faz bem corresponde a uma tendência que devemos cultivar. E este princípio de natureza biológica vale tanto para a orientação do que fazemos para nos proteger dos elementos da natureza que nos agridem, como o frio ou o calor, como também no que respeita à forma como nos relacionamos: aquilo que dá vida nas relações entre nós corresponde a destrinçar e a pesar o que é bom e o que é mau. Por essa razão, sempre apreciei nas pessoas o sorriso, que é o convite ao outro e nunca gostei de pessoas carrancudas. Ontem, indo sentado no banco de trás dum táxi, cruzei-me com uma traseunte...