Les Choristes

Ontem à noite voltei a reviver a enorme experiência quando vi o filme "Les Choristes".
Estavamos, creio, em 2006. Foi dos filmes que mais me comoveu até hoje. Está lá tudo: a dignidade do Ser Humano, a fragilidade, a dificuldade de viver, a liberdade que uns usam de uma forma e outros de outra. Há quem diga que todos os que são felizes são bons, mas que nem todos os infelizes são maus. Aqui reside uma grande lição: aquele Professor não era feliz, mas não deixou de ser bom; Aquele Director não era feliz e não deixou de o fazer sentir a todos à sua volta.
Há, antes de mais, algo que recordo: aquele professor e a sua qualidade só foram recordados muitos anos depois do seu Magistério.
Quando vimos este filme vemos que aquele homem, aquele professor, merecia ser feliz. Era isso que seria justo. E não deixamos de ficar um pouco tristes ao vê-lo sair da escola, expulso. O que lhe terá acontecido depois? É que é muito pouco como consolo a consciência do dever cumprido. Precisamos do reconhecimento dos outros. Precisamos da admiração dos outros. Um herói precisa que os outros lhe demonstrem que a sua acção foi valorosa. Ao menos penso assim... não se faz as coisas para se ser reconhecido, mas o reconhecimento é uma forma de justiça, de consolo.
Aqueles miúdos atiravam-lhe aviaõzinhos de papel pelas janelas. Com quem partilhou o Professor esse consolo? Como terá ficado aquele Professor depois de sair do Fond de l'Étang?

Comentários

Maria disse…
QUE FILME! Todo ele nos envolve, as personagens, a música, que tantas vezes ouço no carro, os diálogos e, principalmente, a GRANDE MENSAGEM!!!

“Les Choristes” um filme que está presente na minha vida, assim como, ” O Clube do Imperador”,” “O Clube dos Poetas Mortos”,” O Sorriso de Mona Lisa”, filmes que vejo e revejo vezes sem conta como tantos outros que contam histórias, aparentemente simples, de homens e mulheres que se entregaram à verdade de Estar e Ser com o outro.

Lembro-me de que, quando vi este filme pela primeira vez, senti uma profunda angústia, lembro-me de chorar, não só pelo lado sensível, mas pela revolta de quem vê alguém que nada ambiciona da vida, nada espera da vida, alguém que como disse não era feliz mas também não “cobrava”, nem exigia mais da vida, alguém que seguia o seu caminho de forma recta, sem grandes apostas, sem grandes paixões que o “levasse ao tudo e ao nada”… e que, de um momento para o outro, se vai encontrando em cada uma daquelas Crianças, vai reagindo a cada um dos obstáculos que vai encontrando; é esse o grande “motor” de todo um crescimento interior, enquanto Professor, enquanto homem e, principalmente, enquanto Ser Humano.

Naquele grupo e naquelas circunstâncias este homem descobre-se, abre “gavetas fechadas” e segredos guardados no mais profundo do seu Ser e arrisca, sem medo, com um humor e uma alegria contagiante, com capacidade de análise objectiva e profunda. Neste homem não houve medo de se entregar; atrevo-me a dizer que não houve tempo para não viver esta entrega plena que aos poucos ia contagiando cada uma das Crianças e todos os que trabalhavam ali… passou a haver uma outra forma de estar, de viver, de respirar, dentro daquela escola desprovida de Amor e o Amor passa por esta dádiva contínua que vai contagiando, vai mudando comportamentos e que vai dando frutos… Também é verdade que nem todos são capazes de viver este Amor que chega, que muda, que faz crescer e que gera Amor… e acredito que quem está fechado para o Amor, não significa necessariamente, que seja má pessoa; basta nunca ter sido amado e talvez, por isso, não reconheça nem saiba gerir esse sentimento em si.

Ao longo das várias vezes que fui revendo o filme, a última, por coincidência, há menos de um mês sinto que a felicidade daquele homem não passava por um gigantesco reconhecimento académico, de quem consegue travar aquela conduta baseada na tão celebre regra “Action/Réaction”. Este homem não teve a força de mudar um regime Educativo, mas teve a força do Amor, da Entrega, da Verdade de não se corromper e de não desistir daquelas Crianças sabendo que, por isso, seria punido; que tudo era uma questão de tempo, mas havia que aproveitar cada bocadinho e oportunidade que lhe era dado… E é para isso que cá estamos… para um bem maior, que está acima do reconhecimento público, que está acima das “justiças” que nos eleva… Sim, concordo que a falta de cumplicidade, de partilha, de reconhecimento, muitas vezes faz-nos sentir solidão… Mas quando olho para o final do filme, assim como o do “Clube do Imperador” ou até mesmo “o Clube dos Poetas Mortos”, encontro a simples resposta… o maior reconhecimento que estes Professores poderiam ter, o maior de todos os méritos, de todas as glórias foi a conquista, a mudança e o Amor daquelas Criança e Jovens.

(...)
Maria disse…
Já falámos, um bocadinho sobre isto, quando num dos seus testemunhos falou da sua exortação no Colégio Planalto: aos “nossos olhos” o importante era o todo, o que é que acharam os Professores; a qualidade do discurso e dos conteúdos; as estratégias de comunicação… isso é importante, sem dúvida… mas isso, sinto, que isso não é o mais importante. É a verdade com que nos expomos à vida, aos momentos, às circunstâncias… sem medo das consequências, e se estivermos seguros, conscientes dos nossos actos, procurando viver de forma coerente e sem corromper aquilo que somos e acreditamos, então acredito que simples aviões de papel, atirados do cimo de uma janela, onde dezenas de mãos dizem adeus, para mim, não um adeus de saudade, mas um adeus de quem “foi salvo”, isso fica guardado para SEMPRE no nosso coração… Independentemente do que viria a acontecer naquele colégio, a missão tinha sido cumprida, agora era apenas uma questão de TEMPO… e esse tempo passou e aquele homem, para mim, no meu imaginário, voltou à sua simples vida, agora numa nova missão, e sereno por todo o caminho percorrido… Por mais que tente não consigo imaginar grandes homens, a quem chamamos de heróis, fechados e isolados num mundo amargurado de frustrações… Pelo contrário, imagino-os sempre na paz e serenidade, por vezes muito solitária, de quem viveu a transformação; de quem saiu de si para se encontrar, de quem se entregou de corpo e alma, na totalidade que lhe era pedida e que essa transformação, lhe trouxe novos desafios, novas conquistas, novas formas de ver, saborear, estar e ler o mundo… é um bocadinho como a tal imagem de Ulisses que chega a Ítaca depois de uma longa viagem, depois de um naufrágio, e aquele “velho moribundo” que ninguém reconhece, apenas o seu fiel cão, apenas tem em si o essencial, aquilo que é!

Gosto de acreditar, que este Professor tenha tido mais paragens, mais momentos de crescimento, mas a passagem por esta Escola, o Amor, a Entrega e Verdade desses tempos, (desculpe a repetição constante) foi sem dúvida um ponto de viragem… Para todos… e qual de nós não se lembra daqueles que entraram e marcaram as nossas vidas, em pequenos gestos, em simples palavras, em curtos olhares… E agora de forma muito particular, a última vez que vi este filme, ele deu-me força, abanou-me, mostrou que a Verdade com que vivemos a nossa vida e o não corrompermos a pessoa que somos é determinante… mesmo quando tudo parece estar noutra direcção…

Sempre que termino de ver este filme, e ainda ao som de uma banda sonora genial, gosto de sentir aquela força maior, optimista, leve e TÃO POSSÍVEL que é esta a capacidade que nos é dada, TODOS OS DIAS: podermos transformar o mundo (mesmo que este seja uma Fond de L’Étang)… na magnífica experiência da nossa própria transformação…

Quem foram e onde estão os “Clément Mathieu” da nossa vida?

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