Medo da liberdade?

"Basta parar por um instante e observar o mundo da natureza que nos rodeia para se ver que tudo fala da gratuitidade inquietante, da fragilidade e da beleza das formas vivas.
Embora tentemos viver em caixas hermeticamente fechadas, o mistério resplandece à nossa volta e sugere-nos o caminho a percorrer. Não existe mediocridade, monotonia. O que existe é apenas o nosso medo. Medo de crescer, medo de nos abrirmos às emoções. Medo de descobrirmos que não há nenhuma jaula à nossa volta, que o que existe é apenas liberdade, ar. E se erguermos levemente os olhos, o espaço infinito do céu
."
O Fogo e o Vento, Susanna Tamaro
Começo este texto com um texto da extraordinária Susana Tamaro. "O que existe é apenas o nosso medo".
Ontem li parte do clássico livro de Scott Peck "O caminho menos percorrido". Nele ele falava da dificuldade de determinada pessoa em se sentir bem com os horários que fazia no seu trabalho, sentindo-se obrigado a trabalhar mais que os outros. Ele achava que para fazer bem o seu trabalho precisava de dedicar-se mais que os outros. Enquanto os outros tinham uma espécie de falta de consciência, ele achava que era seu dever entregar-se a sério ao seu trabalho. E bem. Mas o problema é que se sentia mal porque saía tarde do trabalho. Foi falar com um superior hierárquico. Este disse-lhe: "você tem um problema". O problema era o de que ele não sabia verdadeiramente tomar opções. Não sabia que a vida são as opções que se tomam.
Temos medo da liberdade?

Comentários

Maria disse…
Não consigo iniciar este testemunho, sem antes, sem pretensão nenhuma, mas com toda a verdade, e desde já peço desculpa, dizer que não deixei de ficar surpreendida quando ao reler alguns textos do blog, reparei que pequenas partes tinham sido apagadas… desculpe a sinceridade; o ”confronto” com este simples facto, como disse, surpreendeu-me, talvez por não ter compreendido o porquê… Não espero respostas… mas continuar a escrever neste blog, com a liberdade, espontaneidade e verdade com que sempre o fiz passa, e espero que entenda, por este pequeno parágrafo, sincero…

Não sei se por coincidência, mas há umas semanas acabei de ler um livro de Fernando Savater – “A Coragem de Escolher” que numa linha de pensamento muito objectiva e num discurso esquematizado e simples, toca exactamente este ponto. O que é a liberdade, enquanto característica do Ser Humano, como é que o Homem vive o livre arbítrio, como é que se vive em consciência e dominando o medo, todo um conceito, eu diria experiência, que nos ultrapassa, que está para além do concreto, do racional… a partir do pensamento de Savater integrei , talvez de forma mais consciente a velha máxima de Fernando Pessoa que nos diz: “Primeiro sê livre; depois pede a liberdade. ”

Nunca se falou tanto de liberdade… atrevo-me a dizer que o “uso” desta palavra se tornou banal e vão… Somos livres! Faço-o em nome da minha liberdade! - Gritamos tantas vezes ao mundo. Mas temo-la onde? Guardamo-la onde? Falamos de liberdade, com a força e tensão de quem possui um bem fechado em nós… Dizemo-nos livres porque vivemos em sociedades democráticas, onde nos é “dada” a liberdade de expressão, de acção e de pensamento… mas tornamo-nos, de dia para dia, Seres automatizados, formatados, iludidos com o mundo de possibilidades que nos é proposto, com os prazeres momentâneos que nos aliciam e que, em nome DA NOSSA LIBERDADE, nos levam cada vez mais para uma prisão solitária e vazia… Somos livres, mas cada vez mais insatisfeitos, investimos na nossa formação, procuramos a promoção da carreira; conquistamos patamares económicos; usufruímos dessa conquista, comprando carros, casas, viagens… mas chega um momento, em que tudo cai por terra e, aí sim, compreendemos que somos “escravos” de uma falsa liberdade…
Maria disse…
Então onde se encontra a “verdadeira” liberdade? Aquela que nos liberta? Atrevo-me a dizer que se encontra em nós, desde os primeiros anos de vida, e que uma vez encontrada deve ser “cuidada” como quem cuida do seu bem mais precioso… São as nossas escolhas feitas em verdade, é a autenticidade com que procuramos ver e viver a vida; sermos nós mesmos; de tomarmos decisões e de respondermos pelos nossos actos… e aí sim, experimentamos a plenitude de “ser livre”…
Estaremos nós a viver e a Educar para este bem maior?

Acredito, talvez pelo caminho feito até aqui , que esta dimensão de “ser livre” passa pela capacidade de isolamento, de autoconhecimento, do deserto, para outros, do naufrágio, que nos leva a percorrer caminhos cheios; caminhos repletos de profundas experiências com o outro e com o mundo… Diz-nos Agostinho da Silva que “ a liberdade só existe quando todos os nossos actos concordam com todo o nosso pensamento.” Uma frase tão simples, tão crua na objectividade que transporta… mas para mim, tantas vezes, difícil de viver.

Só é livre, quem vive a autenticidade do seu coração; quem o conhece; quem o “vasculha” na procura de nós próprios, esse “nós” que nos liberta e nos leva a SER MAIS… termino com as sábias palavras de Susanna Tamaro, recordada no inicio do seu texto, e que li pela primeira vez quando tinha 14 anos mas que até hoje me acompanham e, pouco a pouco se tornaram, num difícil mas necessário “exercício”…

“E quando à tua frente se abrirem muitas estradas e não souberes a que hás-de escolher, não metas por uma ao acaso, senta-te e espera. Respira com a mesma profundidade confiante com que respiraste no dia em que vieste ao mundo, e sem deixares que nada te distraia, espera e volta a esperar. Fica quieta, em silêncio, e ouve o teu coração. Quando ele te falar, levanta-te, e vai para onde ele te levar.” (Susanna Tamaro)
Maria disse…
21 de Março - Dia Mundial da Poesia

"Ninguém pode aconselhá-lo e ajudá-lo, ninguém. Há apenas um meio. Volte-se para si mesmo. Investigue o motivo que o impele a escrever; comprove se ele estende as raízes até o ponto mais profundo do seu coração, confesse a si mesmo se o senhor morreria caso fosse proibido de escrever. Sobretudo isto: pergunte a si mesmo na hora mais silenciosa de sua madrugada: preciso escrever? Desenterre de si mesmo uma resposta profunda. E, se ela for afirmativa, se o senhor for capaz de enfrentar essa pergunta grave com um forte e simples “Preciso”, então construa a sua vida de acordo com tal necessidade (...) Então aproxime-se da Natureza. Procure, como o primeiro homem, dizer o que vê e vivencia e ama e perde (...)Uma obra de arte é boa quando surge de uma necessidade. É no modo como ela se origina que se encontra seu valor, não há nenhum outro critério. Por isso, prezado senhor, eu não saberia dar nenhum conselho senão este: voltar-se para si mesmo e sondar as profundezas de onde vem a sua vida; nessa fonte o senhor encontrará a resposta para a questão (...) Aceite-a como ela for, sem interpretá-la. Talvez ela revele que o senhor é chamado a ser um artista. Nesse caso, aceite a sua sorte e suporte-a, com o seu peso e a sua grandeza, sem perguntar nunca pela recompensa que poderia vir de fora. Pois o criador tem de ser um mundo para si mesmo e encontrar tudo em si mesmo e na Natureza, da qual se aproximou."

(Carta a um Jovem Poeta)
Rainer Maria Rilke
Anonymous disse…
Fiquei surpreendido com o que me diz, Maria, de ter sido alguma coisa apagada do blog. Não sei do que se trata, eu pelo menos nada apaguei (pelo menos que me lembre...). Talvez queira dar-me uma ajuda e dizer-me o que terá sido retirado do blog, para eu perceber o que terá acontecido.
Duarte
Maria disse…
Duarte,

Espero que entenda que quando escrevi aquele parágrafo não foi, de todo, numa atitude de “cobrança”, de indignação… o que seria!? … Apenas quis ser verdadeira e sincera com uma pessoa com quem tenho partilhado, em verdade e de forma espontânea, “bocadinhos de vida”… Quando dei por alguns comentários apagados, comentários que o Duarte fizera a respostas minhas … em nenhum momento valorizei ou julguei, apenas questionei… se calhar, a forma directa, como o fiz, deu demasiada e desnecessária importância a um pequeno facto… Se o fiz, foi num momento espontâneo, de quem queria comentar o texto que o Duarte tinha escrito “Medo da liberdade?”mas que não conseguia deixar de expressar, talvez de forma impulsiva, o desaparecimento de dois comentários dos meses de Dezembro e Janeiro.

Maria
Anonymous disse…
Maria, só agora tive oportunidade de voltar ao blog. Vou ter que ver o que se passou porque não apaguei nenhum comentário. Espero sinceramente que acredite porque não gosto de males entendidos. E espero também que continue a contribuir da forma tão interessante como tem contribuido para este blog. Tem sido algo que tenho apreciado muito e que me tem enriquecido.

Duarte

Mensagens populares deste blogue

Uma rainha em peregrinação

JMJ, começa agora!!!

A imaginação cristã para elevar o real